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O que influencia nossa personalidade?


O que faz alguém de índole calma ter uma explosão de violência? Como surge a homossexualidade? Por que algumas pessoas se tornam líderes enquanto outras, igualmente inteligentes, têm um destino medíocre?

Explicar o comportamento humano em seus diversos aspectos - no círculo de amizades, no trabalho, no amor, na fé religiosa - sempre foi um desafio para psicólogos e cientistas. Até hoje, as pesquisas sobre o tema produziram duas correntes antagónicas, que contrapõem a natureza e o ambiente social. De um lado estão os defensores da tese de que todos nascem iguais e a personalidade é formada pela aprendizagem e pelas experiências pessoais. Do outro lado, crê-se que os traços da personalidade são definidos pela herança genética, assim como a cor dos olhos.

Uma série de descobertas recentes terminou com essa discussão. A ideia de que só o ambiente ou só o DNA forma a personalidade foi substituída por outra mais flexível. Todo comportamento tem um componente genético, mas a sua manifestação depende de factores ambientais/sociais. Sob essa visão, genética e sociedade interagem para moldar o jeito de ser de cada pessoa.

AS TRÊS FONTES DA PERSONALIDADE

A revolução nos conceitos da chamada genética do comportamento, nome dado à ciência que estuda a influência dos genes na personalidade, ocorreu por causa dos avanços na engenharia genética e na biologia molecular. Os cientistas são capazes de fazer uma busca minuciosa em todo o genoma e encontrar regiões com genes capazes de influenciar o comportamento humano.

Essas regiões podem ser identificadas em análises de amostras de sangue de irmãos ou familiares com os mesmos traços psicológicos. Já foram encontrados genes e regiões genómicas que tornam as pessoas mais vulneráveis a adoptar comportamentos agressivos ou a sofrer transtornos psíquicos. Também já foram detectados genes relacionados com a orientação sexual e a vícios como alcoolismo e tabagismo.

Os pesquisadores advertem que possuir esses genes não significa que a pessoa necessariamente desenvolva o comportamento ligado a ele. Não existe total determinismo genético, apenas predisposição. Os genes podem se expressar ou não. Alguns são ligados ou desligados pela própria dinâmica do genoma. Outros, pelas experiências pessoais, familiares e pelo ambiente em que a pessoa vive.

Um estudo do Instituto de Psiquiatria do King's College de Londres encontrou dois genes que actuam na libertação de neurotransmissores no cérebro. Esses genes são responsáveis pela depressão e pelas atitudes anti-sociais, mas só se manifestam em pessoas expostas a situações de grande stress, como perda de emprego ou morte de familiares.

Conclusão: ter predisposição genética à depressão não leva ninguém a ficar deprimido. O mesmo acontece com os distúrbios alimentares. Cientistas da Universidade da Carolina do Norte identificaram regiões genéticas similares em amostras de sangue de mais de 400 pacientes com anorexia ou bulimia. Os mesmos marcadores apareceram em pessoas sem os distúrbios, o que comprova a acção do ambiente.

Recentemente, investigadores do Instituto de Psiquiatria de Londres encontraram regiões do genoma que podem influenciar a inteligência. Um gene chamado LIMK1 produz uma proteína que ajuda a desenvolver a cognição espacial. As pessoas que têm esses genes levemente alterados também são inteligentes, mas não têm habilidades para desenho, por exemplo. Outro gene, o IGF2R, está associado à alta inteligência - a sua existência acarreta 4 pontos a mais no QI do portador.

A tendência para o suicídio também já foi identificada no genoma. Cientistas da Universidade de Ottawa, no Canadá, descobriram que pacientes portadores de uma mutação no gene responsável por codificar um dos receptores da serotonina, o neurotransmissor que causa sensação de bem-estar, apresentavam duas vezes mais risco de cometer suicídio.

A descoberta de genes que influenciam aspectos específicos da vida é o que há de mais novo na genética do comportamento. Grande parte das características humanas, porém, é produto de muitos genes - e não de apenas um, como ocorre com a maioria dos traços físicos e doenças.

O fator biológico determina a "personalidade recebida". Dela fazem parte os elementos principais e duradouros como são as funções intelectuais básicas e o temperamento. 

A psicóloga americana Judith Rich Harris foi uma das primeiras pesquisadoras a tentar medir a importância da genética, da família, do círculo de amizades e das experiências pessoais na formação da personalidade.

No seu livro No Two Alike (Não Há Dois Iguais) a Dra. Judith diz que os nossos genes serão responsáveis por cerca de 40% do que somos. Em segundo lugar vêm os amigos, a maior influência que recebemos. E, por último, a família. No caso dos pais, façam o que fizerem, eles não são capazes, sozinhos, de evitar (ou de os proteger) de outras influências muito poderosas e que vêm das comunidades em que os filhos estejam inseridos (localidade, escola, círculo de amigos, etc.).

Por exemplo, a maneira como somos vistos por nossos amigos faz com que passemos a investir em determinados comportamentos. Se o grupo costuma rir das brincadeiras de uma criança, ela se percebe como uma pessoa divertida e tenta repetir esse jeito de ser, incorporando-o para o resto da vida.

Mas nem todos os traços de personalidade, porém, sofrem influência tão marcante das experiências pessoais. Já se comprovou que o desenvolvimento da inteligência depende em grande parte de um ambiente familiar que a estimule. Os geneticistas estimam que, em breve, será possível rastrear regiões genómicas em quantidade suficiente para conseguir mais do que pistas sobre a influência dos genes no comportamento. Graças à associação da psicologia e da genética, está aberto o caminho para elucidar a anatomia da personalidade.

EM CONCLUSÃO

Todos os nossos comportamentos são pois ditados por diversos fatores, desde os biológicos aos sociais. O social é um fator a considerar. Praticamente tudo o que somos, fazemos e como fazemos acontece no que se designa "campo social". Vivemos numa densa rede de influências e, como refere o filósofo espanhol J.A Marina, assim como as recebemos, também nós exercemos "influências educativas, boas ou más, por ação ou por omissão".  Um velho provérbio africano diz isso mesmo: "Para educar uma criança é preciso a tribo inteira".

Tudo isso resulta na "personalidade aprendida" onde se incluem os traços mais estáveis e duradouros, e que se adquirem mais fortemente até ao fim da adolescência.

Por fim, genes e aprendizagens, contribuindo para a personalidade, deixam ainda espaço para o que Marina designa por "personalidade escolhida" - aquilo que, juntando hábitos, carácter e comportamento, desenha o nosso perfil final (mas não finito nem inflexível pois estaremos sempre mudando ao longo da vida tendo como base ou ponto de partida as nossas estruturas biológicas e genéticas).

Nelson S Lima 
in "Evolução e Mudança", de Nelson S Lima, Ed. Ômega, Lisboa, 2016

"EVOLUÇÃO E MUDANÇA" (meu novo livro)


Foi lançado em Junho de 2016, meu novo livro. Seu título é "EVOLUÇÃO E MUDANÇA", da Editora Ômega, Lisboa.
Este livro reúne, em 300 páginas, 60 artigos escritos em diversos suportes (blogues, revistas, jornais, etc.) nos últimos três anos e pretende ser o ponto de partida para meu PROJECTO EVOLUÇÃO E MUDANÇA: actividades de autoconhecimento e promoção do desenvolvimento pessoal que se concretizará através de workshops, palestras motivacionais e outros meios, especialmente no Brasil, aproveitando minha ligação à Unifuturo - Faculdade de Ensino Superior do Nordeste (Paraíba).

A EUFORIA DO EMPREENDEDORISMO


Tem havido uma verdadeira euforia no que respeita ao tema "empreendedorismo". É um dos temas da atualidade que, sobretudo nas áreas dos "novos negócios", tem merecido grande destaque na imprensa e em programas de TV.

Na generalidade, a ideia é fomentar iniciativas que visem a criação de empresas de "grande potencial". Os jovens têm sido aliciados a entrar na onda quer através de algumas organizações que nasceram para isso mesmo quer através dos Governos que desejam apostar em ideias empreendedoras que agitem a economia (e façam baixar o desemprego).

O entusiasmo vai ao ponto de muitos jovens apostarem as suas carreiras (abandonando empregos seguros ou desviando-se dos seus cursos universitários) em negócios de todo o género e feitio, por vezes excessivamente irrealistas e visivelmente utópicos.

Sabe-se há muito tempo que a probabilidade de sucesso de novos negócios é muito baixa. E quando eles têm como ponto de partida ideias que pouco ou nenhum aproveitamento garantem aos seus promotores (exceto na cabeça deles) a fracasso é muito mais viável do que o desejado êxito.

GARANTIA DE SUCESSO? UMA INCÓGNITA

Felizmente, um dia destes um jornal português divulgou uma iniciativa muito útil e oportuna: a de uma organização que coloca frente-a-frente casos de "insucesso" e em que os intervenientes contam as suas desventuras. E não são poucos, como seria de esperar.

É uma "chamada à realidade" para os mais jovens que acreditam que basta ter uma boa ideia e capital para se lançarem na aventura do empreendedorismo. Nada de mais errado. Lamentável é existirem organizações que se aproveitam da ingenuidade de muitos para serem elas a ganharem dinheiro.

Os jovens que se cuidem porque o mercado, o mundo e a época não permitem escorregadelas, algumas de consequências bem melindrosas. E não se deixem levar por tentações fáceis sem estarem devidamente preparados e informados.

Lembro, a título de exemplo, que mais de 90% das "startups" (empreendimentos inovadores) tecnológicas fracassam nos primeiros anos de funcionamento.

Muitos dos sonhos que ficam pelo caminho deixam marcas dolorosas nos envolvidos (e nos bolsos dos investidores).

Sejam empreendedores, sim, mas com realismo quanto baste e com a devida preparação e lucidez (que é coisa rara). Nos negócios não há milagres. Há mais do que isso.

A ARTE DE BEM JULGAR

O saber fazer juizos é uma capacidade inerente à inteligência. Significa julgar, formar opiniões, chegar a conclusões. 

A todo o momento produzimos juizos, isto é, apreciações seguidas de conclusões. Com essa capacidade aprofundamos a nossa relação com o mundo. Todavia, como muitos outros, é um processo mental muito subjetivo. 

Existem dois tipos principais de juizos: juizos de valor (que fazem a distinção de uma qualidade de outra qualidade de algo ou de alguém) e juizos de existência (sobre a realidade objectiva ou subjectiva que nos é dada observar e perceber).

Podemos falar ainda de "juizo crítico" como um processo de avaliação e elaboração de algo ou situação particular comparando os valores relativos dos diferentes aspectos envolvidos. Exige uma boa dose de informação e de conhecimento a respeito do que ajuizamos (julgamos) e um bom trabalho de gestão desses recursos.

A nossa capacidade julgar é afetada pela natureza da nossa personalidade, das nossas capacidades intelectuais, dos estados emocionais, de factores culturais e sociais, etc.

Mas aprofundemos mais o tema. Para se ter uma boa capacidade de tecer juizos é necessário que, previamente, a pessoa tenha uma outra aptidão intacta: é o chamado "insight" - capacidade de estar consciente de si mesmo e do mundo externo. Inclui por conseguinte o auto-conhecimento e envolve os sentidos, a perceção, o pensamento, as emoções, etc.  O "insight" não é uma função psíquica única sendo modelado pelos mecanismos de defesa, a personalidade, as circunstâncias sociais, a educação, o estado de saúde, etc. (com efeito, um bom "insight" pressupõe a integridade das funções cognitivas).

Uma pessoa com um bom "insight" utiliza o conhecimento, integra-o e interpreta-o pelo que faz uso do chamado "pensamento conceptual de alto nível". Sem um bom "insight" não formulamos bons juizos, equilibrados e sensatos.

Num mundo cada vez mais complexo e em que a informação se renova e amplia a todo o instante, a capacidade de tecer juizos e opiniões é igualmente cada vez mais solicitada. Isso aumenta a nossa responsabilidade por tudo aquilo que pensarmos e dissermos acerca das pessoas e dos acontecimentos.

Infelizmente, essa capacidade não está distribuida de forma equilibrada na população. E num mundo em que toda a gente opina sobre tudo e mais alguma coisa (veja-se o que se passa, por exemplo, na atividade política) convém estarmos preparados para sermos bons "juizes".

Nelson S Lima 

O PARADOXO DA INTELIGÊNCIA


Poderá parecer exagero dizer-se que existem centenas de formas para se ser bem sucedido, nomeadamente na resolução de problemas. Todos nós temos várias aptidões que poderão ajudar-nos nesse desafio.

Um dos problemas mais comuns é que as pessoas tendem a usar apenas duas ou três dessas capacidades e, devido a certos hábitos mentais, costumam aplicar a mesma fórmula para problemas diferentes. Ora, se pensarmos bem, descobrimos que cada problema exige abordagens, estratégias e esquemas de raciocínio diferentes.

A questão principal centra-se naquilo que entendemos por inteligência. Um estudo da psicóloga Carol S. Dweek levou-a à conclusão de que não é a inteligência propriamente dita que ajuda a resolver os problemas MAS a maneira como nós escolhemos o tipo de inteligência e aptidões que interessam em cada caso.

É por isso que nem sempre as pessoas com alto nível de inteligência resolvem melhor os problemas. Costumam confiar em demasia em si mesmas. Aliás, por vezes, não se convencem dos seus erros pelo que faz com que insistam neles.

Já as pessoas com um desenvolvimento cognitivo dentro do que se poderá classificar de "médio" são muitas vezes melhor sucedidas na vida porque são mais flexíveis, mais práticas, mais experimentadas, mais criativas e mais ousadas. E não pensam muito na inteligência. Limitam-se a usarem-na sem preconceitos nem excessos de confiança.

O filósofo Jacob Pétry chamou a este cenário cognitivo de "paradoxo da inteligência" já que contradiz a crença de que as pessoas altamente inteligentes são melhores a resolver problemas e a terem mais sucesso na vida. 

Ora a prática revela que a inteligência é de grande utilidade mas não é infalível até porque cada problema envolve muitos fatores e uma ginástica mental apropriada.

Convém sublinhar que a inteligência - que assume diversos tipos e envolve muitas aptidões mentais - pode ser treinada para se tornar melhor e mais eficiente. O lugar privilegiado para o fazer é na escola.

As crianças deveriam ser ensinadas a descobrir os seus talentos intelectuais e serem encorajadas a explorar as múltiplas potencialidades com que nasceram (infelizmente, a educação, por vezes, exerce um efeito contrário bloqueando essas mesmas potencialidades).

Nelson S Lima

ESTAR OU SER CONSCIENTE DE SI?

EU sou EU? Descobri esta pergunta num texto de Nicholas Humphrey, psicólogo, doutorado em Fisiologia, autor de vários livros sendo um deles "A História da Mente" (1992) a quem o conhecido e controverso filósofo Daniel C. Dennett "acusa" de ser um "cientista romântico".

Voltemos ao tema da pergunta desta nota. E regressamos com outra pergunta de Nicholas: "Como podem um corpo e um cérebro humanos serem também uma mente humana?".

Para dar uma resposta convincente, Nicholas estudou vários anos. Repito: estudou vários anos. Estas coisas que nos parecem do senso comum são, porém, bastantes complexas e não podem ser resolvidas com uma resposta intuitiva que nada diz sob o ponto de vista da verdadeira Ciência.

A pergunta poderia ser respondida por filósofos, especialmente os que se dedicam ao estudo da mente. Mas, Nicholas é psicólogo e investigador. Desenvolveu uma teoria que chamou de "consciência reflexiva". Quando escreveu os livros Consciousness Regained (1983) e The Inner Eye (1986) o famoso biólogo evolucionista Richard Dawkins declarou, entusiasmado: "Acho que ele acertou em cheio! Temos por fim a resposta para uma grande questão: como evoluiu a consciência humana!".

Afinal, o próprio Nicholas verificou que estava ainda tudo por resolver. Diz ele que a consciência pode existir a níveis muito baixos, sem existir reflexão, como uma experiência do ser em bruto, a sensação do tempo presente e sensações primitivas como as proporcionadas pelos sentidos. Ou seja, pode-se ser consciente com um mínimo de informações sensoriais. Ele chama a isso o "momento espesso" da consciência. É o que acontece quando uma pessoa se sente viva e viva no momento presente sentindo o mundo à sua volta.

A questão que ele levanta é o da qualidade das sensações recebidas. São essas que permitem a sensação consciente. O seu trabalho em laboratório deu-lhe pistas. Estudou a preferência estética dos animais. Descobriu, por exemplo, que os macacos gostam do azul/verde forte, não apreciam o amarelo, o laranja e o vermelho e o azul acalma-os. Percebeu que os macacos são muito mais sensíeis às cores do que os seres humanos e que, por outro lado, são insensíveis aos sons musicais preferindo o silêncio.

Mais tarde propôs que os constituintes básicos da consciência são os sentimentos e as sensações em bruto (aproximando-se do que António Damásio defende). Para Nicholas a consciência é "a reação imediata do corpo aos estímulos". Já para o seu colega Daniel Dennett esses constituintes são as ideias, os juizos e as predisposições pelo que a consciência só ocorre depois da mente ter construído uma história e "ter feito um relatório".

Diz Nicholas: "Eis o meu modelo de realidade: eu sou eu. Estou a viver uma existência corporizada, no momento espesso do presente consciente" e cita um poema de E.E.Cummings:

"Como o sentir está primeiro
quem presta atenção
à sintaxe das coisas
nunca beijará inteiramente".

O biólogo Francisco Varela (já falecido) não achou a explicação de Nicholas muito convincente. Mas concordou que a ideia de usar a experiência direta - as sensações - para descrever os processos cerebrais da consciência foi muito esclarecedora. Para Varela o "sentido do Eu existe porque nos dá uma interface com o mundo". Embora a consciência do EU não exista como substância, ele acontece como resultado das permanentes interações com o mundo.

Quando perdemos a consciência o que acontece? Deixamos de interagir com o mundo. Quando esta interação reaparece, a consciência apodera-se de nós. Voltamos a estar conscientes. Tal como aconteceria com qualquer outro animal. Só que nós vamos mais longe do que os outros seres vivos: como temos uma autoconsciência (que Augusto Ciury chama de "consciência existencial") sabemos quem somos.

Mas ainda subsistem muitas dúvidas nesta matéria. Sabemos o que é a consciência e o que é a autoconsciência. Não temos, porém, ainda respostas para perguntas como as que o professor de biologia cognitiva e comportamental Christof Koch, do California Institute of Technology, lançou recentemente na revista Scientific American.

Diz ele que, apesar dos cientistas estarem a revelar a base material da mente consciente (usando recursos como a ciência da informação e a matemática!) falta ter certezas sobre questões como:

- um paciente gravemente doente pode estar consciente?
- um feto não tem ainda consciência?
- quando é que um recém-nascido adquire consciência?
- um cachorro tem autoconsciência como "ser pensante"?
- e quanto à internet, com seus milhões de milhões (bilhões) de computadores conetados, poderá um dia adquirir consciência?

Um dos atrativos da Ciência é levantar questões e lançar dúvidas mesmo sobre matérias dadas como adquiridas. As respostas sucedem-se umas às outras. Quanto mais forem, mais próximos ficamos da verdade. Mesmo sabendo que, pelo caminho, se cometem muitos erros. Mas vale mais isso do que mantermo-nos na ignorância, defendendo, por vezes, ideias absurdas e obscuras.

Nelson S Lima

Imaturidade Humana


A lista das nossas fraquezas é enorme e elas ocorrem todos os dias, em todos os lugares do mundo e nos mais diversos contextos. É verdade. Somos uma espécie animal estranha porque é a única capaz de maltratar, enganar, roubar, escravizar e matar os seus próximos. Molestamos crianças, elas que são a garantia da nossa continuidade. Desprezamos e abandonamos idosos e incapacitados. Tivemos 5 mil guerras em 3 mil anos, duas das quais de âmbito mundial. Isto é assustador.

E, no entanto, também somos perfeitamente capazes de comportamentos altruístas, compaixão, solidariedade, empatia, amizade e amor além de exercermos tantas aptidões artísticas, tecnológicas e científicas que chegámos ao século XXI usufruindo de uma série de benefícios que se repercutem positivamente na qualidade de vida de um número crescente de pessoas!

Este comportamento contraditório e ambivalente tem levantado inúmeras suspeitas sobre a verdadeira natureza humana. Quem somos, afinal? Qual parte de nós é que é verdadeira? Em que parte do caminho, ao longo da história, falhámos? Somos um erro da natureza?

SOMOS SERES VIVOS NO PRINCÍPIO DA SUA HISTÓRIA
Sobre isto muito se tem pensado e escapam as respostas que nos satisfaçam. Admitimos, na pior das hipóteses, que temos as duas facetas: que somos capazes do melhor e do pior. Que é sorte quando tudo corre bem. Que é azar quando as coisas correm mal.

Alguns, mais benevolentes, apontam o dedo à educação. Que é na educação que está a resposta. Outros, que é na boa religião. Não creio que seja em qualquer delas. Até porque quer a educação quer a religião já produziram monstruosidades em todos os tempos.

Penso nisto há muito, talvez desde a minha adolescência. E procuro a resposta. Porque tem de haver uma resposta.

A mais óbvia e cientificamente correta é que somos seres com uma curtíssima história. Os nossos antepassados mais remotos apareceram apenas há 2 milhões de anos e mantiveram-se num estado primitivo quase todo esse tempo (para os menos habituados a estes números lembro que só aparecemos na Terra mais de 66 milhões de anos depois da extinção dos dinossauros).

A nossa espécie despontou há apenas 200 mil anos e com características que ainda possuímos. Fomos povoando a Terra lentamente enquanto íamos aprendendo a viver nas mais diversas condições. Foi somente há 5 mil anos que erguemos a primeira povoação digna de se chamar cidade (Jericó, na atual Palestina). Cristo só apareceria três mil anos mais tarde.

Ainda há 100 anos, apesar da expansão industrial, a maior parte do mundo vivía em plena Era Agrícola, em condições deploráveis, com uma esperança de vida baixíssima e uma elevada mortalidade infantil. As doenças contagiosas eram a principal causa de morte (só a peste pneumónica de 1918-1919 matou mais de 40 milhões de pessoas em todo o mundo).

Ou seja, a nossa própria história, tão cheia de acontecimentos, é muito curta no tempo. Biologicamente falando, somos uma espécie muito recente que ainda está em desenvolvimento (geneticamente lento mas mental e culturalmente rápido e muito diversificado levando ao que se tem chamado de "choque de civilizações" ou "conflitos culturais").

ENTRE EXTREMOS
Somos maus e somos bons. Somos estúpidos e somos inteligentes. Campos aparentemente contraditórios devido ao emaranhado de instintos e emoções que nos obrigam a comportamentos egoístas mas também colaborativos porque somos uma espécie que vive em sociedade, com uma tendência tribal, e que se serve da inteligência para melhor chegar aos seus fins (individuais ou coletivos).

Um dos mais notáveis biólogos e naturalistas do mundo, Edward O. Wilson, autor de mais de 20 livros como "A Diversidade da Vida" ou "A Conquista da Terra", diz que temos de ser assim mesmo porque "os nossos instintos continuam a não estar preparados para a civilização". Concordo. Vejo isso todos os dias.

Também não sabemos nada sobre o nosso futuro mas Wilson explica que teremos de viver num equilíbrio instável, talvez sem chegarmos ao extremo de formarmos bandos de egoístas dependentes de interesses pessoais e tribais nem ao limite de nos comportarmos como formigas totalmente controladas pelas regras inflexíveis da sua colónia, sem espaço para a liberdade e a criação.

Dependeremos cada vez mais do sabermos equilibrar instintos, emoções e inteligência na certeza de que a nossa evolução como humanos é um esforço tanto pessoal como coletivo.

Os genes mantêm-nos humanos iguais aos nossos ancestrais de há 100 ou 50 mil anos se bem que, algures no tempo, nos tivéssemos libertado do determinismo biológico e adquirido a capacidade de escolher o nosso caminho (o livre-arbítrio). Todavia, cada dia verificamos que temos necessidade de aprender a fazermos cada vez mais BOAS ESCOLHAS que sirvam a cada vez mais ampla e complexa sociedade humana.

A nossa estrutura mental ainda continua em desenvolvimento. Estamos longe do patamar seguinte, seja ele qual for. Somos, enfim, uma espécie muito jovem, ainda em busca de respostas, tateando e aprendendo num mundo cada vez mais complexo e incerto. A evolução cultural é que poderá livrar-nos da extinção (se exceptuarmos qualquer catástrofe natural de dimensões extraordinárias).

Viver tornou-se num enorme desafio à nossa inteligência individual e coletiva.

Nelson S Lima

Você conhece os seus limites?


O perigo maior no mundo de hoje tem origem quer no excesso de estimulação quer nos problemas adaptativos relacionados com a mudança (uma característica da vida). Nosso organismo tem uma margem de segurança ampla e por isso nós até somos capazes de nos surpreender com as suas possibilidades de resistência quando enfrentamos algum desafio insuperável para outras pessoas.

Nós vivemos num ambiente sobrestimulado no capítulo sensorial, especialmente estímulos visuais e auditivos. Esta sobrecarga em todo o mundo urbanizado e industrializado está afectando milhões e milhões de pessoas, incluindo nossos filhos. Vivemos numa sociedade cheia de luz, brilho, sons e movimento. Da sociedade pacata dos tempos antigos passámos para uma sociedade que chega a ser desconfortável pelo excesso de estímulos díspares e caóticos.

PENSAR RÁPIDO. AGIR DEPRESSA.
Em nossa época, o bombardeamento dos sentidos não está sozinho. Temos também de enfrentar a aceleração do pensamento e a necessidade de tomarmos decisões rápidas. A aceleração do pensamento é forçada pela quantidade de informações que recebemos e que nosso cérebro tem de processar. A tomada de decisões urgentes resulta do estilo de vida (e de trabalho) que levamos. Ou seja, temos de perceber, pensar e agir rápido sobre um número enorme de questões que exigem resposta.

Nelson S Lima

CIÊNCIA E ESPIRITUALIDADE

A propósito deste tema, Harold S. Kushner, autor do livro best-seller "Quando Acontecem Coisas Más às Pessoas Boas" escreveu, num outro livro, mais recente, "Saber Viver Num Mundo Incerto", o seguinte: "o desaparecimento dos seres humanos do nosso planeta implicaria o desaparecimento de Deus" (pág.104). Kushner é um rabino, um famoso homem da Igreja.

Também a propósito de um outro livro fantástico, de Alan Weisman, "O Mundo Sem Nós" (2007), Kushner diz que "num certo sentido, a questão não é se Deus salvará os seres humanos da extinção, mas se os seres humanos salvarão Deus de desaparecer em resultado da sua autodestruição (pág.105).

Finalmente, Kushner, que foi premiado pela Igreja Católica, afirma: "Se retirarmos os seres humanos do planeta, também retiramos Deus" e "um mundo sem pessoas seria um mundo sem Deus".

Como é óbvio, Kushner fala do Deus criado pelo Homem, aquele em que as pessoas crêem porque precisam de acreditar para se sentirem mais seguras. É o resultado da nossa pequenez perante os grandes medos da Humanidade como a doença e a morte (ver nota que escrevi sobre o assunto) que levaram os antigos a procurar deuses e depois um Deus Superior e único.

Eu creio que as pessoas estão de boa fé ao acreditarem e seguirem o "seu" Deus. Mas penso (reparem que não digo "acredito") que o "Deus" de que os crentes falam é uma outra instância que está para além de tudo quanto possamos imaginar, para além da minha compreensão.

Autores como Deepak Chopra defendem um conceito de Deus que é mais próximo do meu. Para aquele autor, Deus é algo mais do que o Deus popular que as pessoas adoram com alguma idolatria ingênua pelo meio. Deus é a inteligência que está por todo o Universo, por todo o mundo conhecido e desconhecido. É a essência da Vida. É imaterial. É pura energia e informação.

Atrevo-me a dizer que quando os estudiosos observam as estrelas mais afastadas do Universo ou quando investigam os processos que ocorrem em cada célula dos organismos vivos eles estão muito mais próximos de "ver Deus" do que aqueles que a ele rezam todos os dias.

Por isso é que cada vez mais pessoas dizem, sem complexos, que a Ciência e a Espiritualidade andam de mãos dadas (ainda que os seus agentes teimem em dizer que não).

Ora, a meu ver, não há oposição. A VIDA, como eu a entendo, tem os dois "campos de ação" entrelaçados: o espiritual (imaterial) e o científico (material). É por isso que há, muitas vezes, "milagres" e outros eventos que não entendemos ainda. E muitas mais horizontes que desconhecemos por enquanto.

Ver as coisas deste modo, obriga-nos a ter uma mente aberta. Sejamos crentes, ateus ou agnósticos.

Nelson S Lima

Com a verdade me enganas?


Este é um tema complexo embora lidemos todos os dias com ele: o da "verdade". De forma simples e imediata nós entendemos como verdade aquilo que se pode provar. A verdade é algo factual, que pertence ao mundo do objetivo, do concreto, do específico. Aliás, antigos filósofos, como os estóicos, diziam que a verdade é do domínio da ciência, do conhecimento. Pode ser contestada mas não perde a sua essência: a verdade é sempre verdade. Se assim não fosse pertenceria ao domínio do "falso", da "mentira" ou do "engano".

Lidar com a verdade é um exercício complexo. É que, para muitas pessoas, a verdade está colada a alguma forma de crença. Se uma pessoa acredita que algo corresponde à verdade é difícil, por vezes, fazê-la crer que pode estar enganada. Só que o problema é mesmo complexo porque quem nega uma verdade que outro defende pode estar enganado. E então quem tem razão? O que deve prevalecer perante duas verdades em que, hipoteticamente, uma delas não é verdade?

ESTAMOS SEMPRE SUJEITOS AO EFEITO PLACEBO

Um exemplo muito corrente é o das testemunhas de acidentes. Cada uma delas tem a sua verdade e está disposta a jurar por ela. Quando alguém diz falar a verdade quando todos os outros dizem ter verdades que são distintas da sua gera-se a confusão. É por isso que os tribunais se enganam muitas vezes nos seus juízos. E os jornais também. E todos nós.

Durante séculos prevaleceram "verdades" reconhecidas por autoridades que se assumiam "donos do saber", como foi o caso da igreja católica. A inquisição - polícia religiosa - não tinha problemas em perseguir e aniquilar quem tentasse ou teimasse afirmar que o que era propagado como verdade não passava, afinal, de um erro e era, por conseguinte, "falso". Na ciência também ocorre muitas vezes.

Nas relações humanas, a verdade anda sempre de mãos dadas com a crença (do género "eu acredito que é verdade"), os erros de percepção (o nosso cérebro engana-nos frequentemente e os mágicos sabem muito bem como trocar as voltas à nossa visão fazendo-nos acreditar em algo que não passa de um truque). Aliás, o nosso cérebro, na ânsia de encontrar referências, chega a construir modelos mentais que não passam de ilusões de ótica. E em casos patológicos, temos as alucinações.

A verdade também pode ser compreendida na ótica do observador. Eu posso estar perante uma verdade com força científica que ulteriores observações vão pôr em causa. É assim que muitas vezes o conhecimento avança.

O perigo da verdade é agarrarmos-nos de forma definitiva ao que os nossos sentidos e o nosso entendimento nos fazem crer. Há muitos estudos científicos que demonstram como é fácil as pessoas terem como verdade apenas aquilo em que acreditam e nada mais.

O efeito placedo (usado em testes médicos e também em marketing) é uma das provas mais fiáveis de fazer acreditar em algo que não passa de um embuste. O hipotético medicamento a quem o investigador atribui efeitos curativos leva o sujeito testado a sentir melhoras que são geradas pela mente e não pelo falso remédio. A verdade é que muitas vezes o efeito placebo funciona. É assim também que a publicidade funciona. Onde está a verdade? Ou há mais do que uma verdade num mesmo facto?

VIVER COM CERTEZAS

No dia a dia é importante vivermos com certezas. Seria impossível vivermos num mundo em que tudo nos causasse dúvida por falta de garantias quanto à verdade com que precisamos de lidar. Mas, de facto, o tempo acaba por nos abrir os olhos e verificar que nem sempre o que nos pareceu verdade numa determinada altura não passou de uma não-verdade (talvez uma outra verdade mas não a esperada).

Não gosto muito das pessoas que estão cheias de certezas. Eu também tenho certezas e uma delas é que posso estar enganado! E isso faz toda a diferença  pois estou sempre disponível para rever as minhas anteriores "verdades" e certezas.

Nelson S Lima

Ter saúde é uma coisa maravilhosa!


Aos 45 anos de idade começou a correr. Aos 71 anos já tinha participado em 151 maratonas. Chamava-se Ralph Paffenbarger e foi um dos médicos fundadores da máxima "mexa-se pela sua saúde". Fez numerosos estudos sobre o tema juntamente com o seu colega Jeremiah Morris (que viveria até aos 99 anos) tendo ambos mudado a crença (que persistiu até meados do século passado) de que o melhor para a saúde e o coração era o descanso e o sedentarismo.

Morris chegou mesmo a fazer um estudo em que participaram 31 mil funcionários dos transportes públicos de Londres. Objetivo: saber qual a profissão, entre eles, que mais os protegia de doenças cardíacas. E descobriu que aqueles que tinham trabalhos mais pesados sofriam muito menos de problemas cardíacos e de outras doenças!

O investigador e médico oncologista, Dr David Agus, atual defensor de uma medicina baseada na prevenção e no diagnóstico, descobriu também que fazer algum exercício - evitando o sedentarismo - ajuda o sistema imunológico a revigorar-se.

"Mexa-se pela sua saúde" é uma máxima que não se aplica apenas ao coração ou à necessidade de nos mantermos com a gordura e o peso ideais. Esse "mexer" não é para que as pessoas emagreçam para ficarem mais esbeltas. Não. É para que o organismo se mantenha revigorado, incluindo a atividade mental.

Será que nos esquecemos que somos seres vivos - mais precisamente animais - e que o movimento é absolutamente necessário para que possamos estar em forma?

BENEFÍCIOS TAMBÉM PSICOLÓGICOS
Mas vamos à lista de benefícios mentais que obtemos com algum exercício físico regular, nem que seja uma caminhada vigorosa (pelo menos 30 a 90 minutos por dia):
- ajuda a baixar a ansiedade;
- reduz o stress;
- desenvolve a capacidade de sermos pacientes (travando a impulsividade);
- facilita a disposição mental para mudarmos;
- melhora as funções cognitivas (pensar, reflectir, imaginar, criar, etc.);
- predispõe-nos para hábitos positivos e saudáveis;
- desperta mais "insights" criativos;
- melhora a inteligência (e os comportamentos inteligentes).

E NO RESTO DO CORPO?
A lista de benefícios é mais longa e promissora. Ao mexermos-nos - através de exercícios aeróbicos como a caminhada, o jogging, pedalar e nadar - nós damos mais vida às nossas células e órgãos oxigenando-os e tornando-os mais funcionais. Destaco:
- o fortalecimento dos músculos envolvidos na respiração.
- o revigoramento e aumento do músculo cardíaco.
- a diminuição da pressão arterial.
- a elevação do número de células vermelhas do sangue.
- o aumento das reservas de energia nos músculos, o que aumenta a resistência física.

Nelson S. Lima

AFINAL, O QUE FAZEM AS ESCOLAS?

Mal do logos estéril

A escola, em vez de formar
pensadores, pode arrasar
com a inteligência dos alunos.
.
Um dos grandes contributos do psicólogo Howard Gardner para a nossa compreenção da diversidade da natureza humana foi a sua teoria das Inteligências Múltiplas. Ele nos fez ver que a inteligência humana não podia ser entendida plenamente senão através de uma visão multifocal da mesma. Na altura ele proclamou que havia 7 inteligências distintas tais como a inteligência lógico-matemática, a inteligência musical ou a inteligência social. Cada ser humano teria então diferentes "habilidades" naturais que influenciavam a sua prestação profissional, social, etc. Mais tarde ele descobriria outras inteligências.

O que importa aqui salientar é o facto de cada ser humano nascer com potencialidades distintas, mesmo no domínio da inteligência que já não fica limitada ao valor de um Q.I. mas que se pode exprimir através de diferentes possibilidades, aptidões e talentos. O Q.I. deixou de servir como artefacto de diferenciação pois se uma pessoa pode ser exímia no raciocínio analítico e matemático outra pode revelar-se de forma notável na produção criativa e artística.

Infelizmente e apesar de já terem passado muitos anos sobre a divulgação da teoria das inteligências múltiplas, as nossas escolas continuam a ignorar tudo isso. Aliás, poucos professores conhecem inteiramente aquela teoria e muitos menos a sabem aplicar. E nem podem. Não podem porque o ensino ainda está cada vez mais massificado, desrespeitando a natureza distinta do intelecto de cada aluno. 

De forma que todos aprendem o mesmo e, pior ainda, aprendem muito mal. Aprendem por via da recepção passiva de conhecimentos que os professores metodicamente transmitem, repetindo em cada época escolar as mesmas coisas às novas turmas de alunos que vão chegando dos anos anteriores.

Isto leva a uma situação muito dramática: o desrespeito pelos talentos particulares de cada aluno e a imposição de um ensino unifocal, engessado, memorativo, passivo e repetitivo. A escola, em vez de formar pensadores, arrasa com a inteligência dos alunos, torna-os repetidores de frases feitas, nomes, datas, definições, por vezes retrógradas sobre o Mundo.

Augusto Cury, também muito sensível a este problema, escreve que isto trouxe "duas das maiores drogas da inteligência humana: a massificação da cultura e do pensamento". Estas "drogas", "não conseguem jamais conter a diversidade de pensamentos" que existe em toda a humanidade "mas engessa a liberdade, a plasticidade, a criatividade da construção multifocal dos pensamentos, encerrando a inteligência humana num cárcere". Isto conduz ao que A. Cury chama de "mal do logos estéril".

Que síndrome é este? Cury define-o como doença social com sintomas bem determinados: a vítima torna-se num espectador passivo daquilo que aprende por transmissão; incorpora os novos conhecimentos sem prazer, sem crítica, sem desafio, sem aventura; vê sua capacidade de pensar reduzida e de criar; diminui a sua consciência política e social; utiliza o conhecimento adquirido apenas como ferramenta profissionalizante para fins próprios (ganhar dinheiro, por exemplo).

Nelson S Lima

A ORIGEM DA INTELIGÊNCIA


Esta é uma questão ainda em aberto. Há várias hipóteses. O bipedismo (que permitiu a marcha e uma visão mais vasta do horizonte) e posteriormente a linguagem originaram transformações radicais nas sociedades primitivas. Isto originou saltos qualitativos na evolução. Vários autores destacam a linguagem como o fator determinante para a inteligência humana. Há cerca de 5 ou 6 milhões de anos, o aparecimento da cultura dos australopitecus originou algumas estruturas sociais essenciais, nomeadamente a ligação entre casais para reforçar a proteção, aumentar a cooperação na obtenção de alimento e assegurar a sobrevivência da espécie através de uma maior proteção das crianças.

Outra mudança extraordinária e vital deu-se há cerca de 2 milhões de anos quando, gradualmente, o tamanho do cérebro começou a expandir-se e tornou possível aumentar a capacidade de memória e de aprendizagem.

Para Edgar Morin (2000) a caça foi a grande impulsionadora da inteligência humana fazendo dos homens primitivos intérpretes de um grande número de estímulos sensoriais ambíguos e fracos que passaram a constituir sinais, indicações, mensagens, espevitando a inteligência, e "fazendo-a lutar por aquilo que há de mais hábil e de mais manhoso na natureza, o animal presa e o animal predador, pois ambos dissimulam, esquivam e enganam".

Já o professor Jonathan H. Turner (2003) defende que foram as emoções , ou seja, o amplo leque de emoções de que o ser humano dispõe, que lhe permitiram desenvolver competências sociais, nomeadamente formas arcaicas de linguagem e, posteriormente, a fala, aumentando dessa forma a inteligência.

Com efeito, a capacidade cognitiva necessária para se viver em grande grupos é considerável pois estes são instáveis, exigentes, feitos de indivíduos heterogéneos e, por conseguinte, exigindo de cada um várias aptidões como a memória, a capacidade de interpretar, compreender e prever as reacções dos outros, e a comunicação interpessoal. Ao longo de muitos milhares de gerações o cérebro foi acumulando novas estruturas e desenvolvendo novas capacidades à medida que os humanos primitivos procuravam adaptar-se ao mundo hostil que os rodeava e para o qual tinham permanentemente de estar preparados para se defenderem.

A evolução da mente terá partido, por conseguinte, dos centros operacionais arcaicos (apenas necessários à sobrevivência) chegando lentamente às atuais estruturas cognitivas responsáveis pelo pensamento e a auto-consciência.

Muitas perguntas persistem. Na verdade, onde apareceu a nossa espécie? De quem descendemos, efetivamente? Como nos tornamos tão inteligentes ao ponto de transformarmos radicalmente a superfície do planeta Terra comoo nenhum outro ser vivo o fez?

Nelson S Lima 

CONTROLO DA MENTE


O controlo da mente é um assunto delicado, pois levanta questões éticas e morais. Todavia, o controlo da mente também pode realizar-se em contextos social e moralmente aceitáveis. O controlo da mente - sobre os outros - se faz facilmente pois o ser humano tem pouco desenvolvida sua capacidade de defesa face aos instrumentos e às mensagens de controlo que lhe são aplicados.

O ser humano é, neste domínio, ingênuo e crédulo. Seus recursos defensivos não estão musculados e, por isso, é facilmente manipulável mesmo sem o sentir, isto, sem disso ter consciência.

No nível básico, o exercício do controlo da mente, se faz quando tentamos convencer os outros da validade da nossa argumentação e procuramos estabelecer crenças em suas mentes. É o que se faz, por exemplo, na escola tradicional em que as crianças aprendem as instruções ditadas pelos professores. Ninguém discute a "sabedoria" e as "certezas" dos professores. Esta atitude torna as crianças altamente vulneráveis aos "ensinamentos" da autoridade que a criança sente no professor.

Desde esse momento seu cérebro fica preparado para futuras manipulações. E porquê? Porque a escola não desenvolve o senso crítico nem permite a contestação, a dúvida ou negação. Professor manda. Professor sabe. Professor é autoridade. E os pais confirmam.

Nos níveis superiores chegamos à propaganda: a comercial e a eleitoral. Aqui, muitos esforços têm sido feitos para que as mensagens sejam credíveis e aceites como verdades indiscutíveis. Formam-se crenças. Veja-se o poder que certas marcas têm sobre os jovens ao ponto de estarmos certos de que muitos consumidores não compram os produtos mas as marcas que lhe dão nome. Os exemplos, nas últimas décadas, têm sido muitos e variados: Coca-Cola, Adidas, Nike, etc.

Ingenuamente, milhões de consumidores "confundem" as marcas com os produtos de tal forma que através de "testes cegos" (em que os voluntários ignoram as marcas) eles perdem o sentido de escolha. Os erros que cometem revelam como a "marca" influi suas preferências. Isto é aceite pacificamente mas a verdade deve ser dita: é manipulação da mente. Consumidor informado e dotado de sentido crítico e racional não reage por impulso nem emotivamente ao ponto de ser controlado. Infelizmente isso é difícil porque nosso cérebro é honesto.

Na espionagem e na política de alto nível, as técnicas de controlo da mente para impor ideias, crenças, ideologias e outros vírus mentais são mais refinadas.

Nelson S Lima

ESTADOS CEREBRAIS E COMPORTAMENTOS

Tive recentemente acesso a um estudo de meus colegas norte-americanos em que estes defendem a existência de 5 estados cerebrais que conduzem a pensamentos, sentimentos e comportamentos que variam conforme o nível desses mesmos estados.

Por exemplo, quando estou a dormir estou num estado cerebral marcado por um conjunto de condições cerebrais que podem ser verificadas num eletroencefalograma (que mede as ondas elétricas cerebrais). Quando estou num "estado de fluxo", profundamente concentrado e quase em transe hipnótico (ou de atenção fascinada), estou num outro estado cerebral.


 Vamos então ver esses cinco "estados".

O "estado cerebral nível 1"
Origina o pensamento abstrato, sentimento de alegria e bem-estar,  boas relações íntimas,  atenção focalizada e seletiva e comportamentos óptimos.

O "estado cerebral nível 2"
Facilita mais os pensamentos concretos, o equilíbrio emocional, as relações amigáveis, um bom nível de consciência e um comportamento saudável.

O "estado cerebral nível 3"
Desce de qualidade. O pensamento torna-se mais rígido, as emoções são mais oscilantes embora as relações se mantenham cordiais, predomina já alguma desatenção ou desinteresse e os comportamentos primam pela moderação, sem entusiasmos.

O "estado cerebral nível 4"
O pensamento é reativo, as emoções revelam algum desequilíbrio, com extremos, a pessoa mostra algum desligamento da realidade (desinteresse) e os comportamentos chegam a ser doentios.

O "estado cerebral nível 5"
Predomina a irracionalidade do pensamento, o stress profundo, um grande desprendimento nas relações, obsessões e comportamentos destrutivos. A pessoa, neste estado, está no seu pior.

Nelson S Lima

CONTROLAR AS PREOCUPAÇÕES


Confesso que tive uma vida interessante mas onde não faltaram (nem faltam) motivos para preocupações. No passado consegui vencer algumas, outras não. Nem sempre conseguimos livrar-nos delas, sobretudo quando elas têm origen em outras pessoas que não podemos evitar (profissionalmente, por exemplo).

Como devem imaginar eu levo uma vida onde não faltam preocupações, algumas delas viscosas e desgastantes. São os compromissos, as diferentes tarefas, as rotinas saturantes, os afazeres que sou por vezes obrigado a adiar, a atenção dada à família (e, muito em especial, aos filhos), etc. Vocês sabem como é pois, mesmo com vidas diferentes, todos nós estamos sempre envolvidos por preocupações.

As preocupações decorrem de prazos que temos de cumprir, de atividades que têm de ser feitas (sobretudo as que não nos cativem), de aborrecimentos variados, de indisposições, de doenças e tratamentos, até mesmo de pessoas que nos aborrecem, e tudo o mais que vocês sabem tão bem como eu.

Ao fim de uns anos de sermos assolados constantemente por preocupações chegamos a um ponto em que quase só nos restam duas saídas: ou desistir de tudo (que é o que às vezes nos apetece fazer); ou arranjar um modo qualquer de contornar os problemas. É óbvio que só teremos a chance de escolher uma delas se, entretanto, o stresse, a ansiedade ou a depressão (ou todas juntas) não nos tiverem abatido e colocado fora de combate.

UMA SOLUÇÃO NÃO IMPOSSÍVEL

Eu aprendi, em tempos, a preocupar-me o mínimo possível, distanciando-me das coisas. É difícil e nem sempre tenho êxito nessa estratégia. Mas vale a pena tentar, embora apeteça desistir quando nos sentimos sufocados.

O que costumo fazer é não me preocupar muito com assuntos que não passam ainda de pensamentos acerca de algo não concretizado. Há pessoas que começam cedo demais a preocupar-se com isto e com aquilo (tarefas, exames, entrevistas, viagens, decisões distantes no tempo, etc.) e ocupam o pensamento com toda a tralha que são capazes de imaginar, criando uma espiral de ansiedade da qual não se libertam facilmente.

Também defino prioridades para as próprias preocupações para que não me sufoquem. Ou seja, perante um novo problema, pergunto-me se tenho que me preocupar mal ele surja. Geralmente, não vale a pena o desgaste. Além de que, se me preocupar antes de tempo, corro o risco de perder energia e discernimento para o resolver na hora devida.

Depois, tento quantificar a urgência e a importância do assunto. É mesmo urgente pensar já nele? Quão grave é? Que impacto pode ter na minha vida?

Se mantivermos alguma hipótese de nos distanciarmos temporalmente e emocionalmente desse tipo de assuntos, as preocupações terão menor impacto. Assim, quando chegar a altura de os enfrentarmos, estaremos mais fortes para o fazer.

OUTROS ERROS

Muitas vezes antecipamos excessivamente cedo os motivos das preocupações que infestam a nossa vida. E isto não é bom porque nos cansa e até desmotiva.

Salvo raríssimas exceções, a maioria das preocupações não valem a energia que nos fazem despender antes de tempo. Vivemos tempos difíceis e atormentados. Temos de nos preocupar com isso, é verdade. Mas não poderemos adiar para depois tudo aquilo que o simples pensar nisso possa trazer de mau? Na hora certa, atuaremos. Sofrer antes, não. Se tivermos de sofrer, que seja na hora certa.

Muitas vezes somos também contagiados pela atmosfera emocional das pessoas facilmente preocupadas até com pequenas coisas, daquelas que nem se pode dizer que são problemas. Mas que nos infetam com os seus lamentos, os medos infundados, as repetições sucessivas das suas preocupações quotidianas e banais, lá isso é verdade.

E, FINALMENTE...
Paremos para pensar. Façamos uma lista de tudo aquilo que mereça a classificação de "motivo de preocupação"e arrumemos as coisas conforme a sua urgência e importância.

Assim, mentalmente organizados, é mais fácil viver. Mesmo que se avizinhem novas preocupações. Na hora certa, pensaremos nelas. Agora, não. É a minha nova regra.

Nelson S. Lima 

QUANDO DESAFIAMOS OS LIMITES


Na vida não devemos acomodar-nos a rotinas e situações que nos tornem prisioneiros do tempo e do espaço ao ponto de perdermos de vista outras alternativas e possibilidades.

Pela própria forma como estamos organizados é bem mais fácil não deixarmos que muitas coisas mudem. Sentimo-nos mais seguros quando estamos familiarizados com aquilo que conhecemos. A novidade desperta a curiosidade mas daí até à mudança vai um passo que nem sempre queremos ou não somos capazes de enfrentar.

Em outras pessoas dá-se o contrário. Elas adoram experimentar o extremo, desafiando os limites de tudo o que possa estar em jogo. São atraídas pelo risco e os picos de adrenalina que o cérebro injeta no sangue. Em muitas ocasiões é a própria vida que fica em causa quando elas ultrapassam os limites do que poderemos chamar "segurança".

Ora, na vida, devemos conciliar as duas situações: a manutenção do que nos dá conforto e confiança, e também o experimentar as sensações do que está fora daquela zona segura e comodista.

Devemos apenas ter em mente que nesse exercício de experimentarmos os limites corremos sempre algum risco. E assim sendo é bom lembrar a Natureza. Por exemplo, a flexibilidade é a regra para que as árvores possam aguentar os ventos fortes do inverno dentro dos seus limites (que, quando ultrapassados, as deitam por terra).

No que respeita ao nosso corpo ele usa um mecanismo de equilíbrio (homeostase) que está sempre ajustando a atividade de todos os órgãos para manter-se saudável, mesmo quando o expomos a adversários de peso como uma alimentação desajustada, falta de sono, stress crónico, fadiga, tensão e outros elementos de esforço radical.

Saibamos correr riscos mas com bom senso e inteligência para não nos arrependermos de termos ido muito além das nossas capacidades efetivas. Nunca nos esqueçamos que os excessos desafiam sempre os nossos limites (na saúde, nas relações sociais, no trabalho, no desporto, no dinheiro, no comportamento, etc.).

Para ultrapassarmos os nossos limites temos de aprender a fazê-lo. E aprender também a administrá-los para que possamos superar-nos com segurança.

Nelson S Lima 

EDUCAR A PERSONALIDADE

Em defesa de uma Teoria Educativa da Personalidade


Será que a personalidade pode ser educada? Eu respondo que sim. Aliás, é um dos temas mais importantes daquilo que eu defendo na educação das crianças. É uma responsabilidade da família e também da sociedade em geral.

A personalidade é um verdadeiro património privado que determina como somos e que se expressa através dos nossos comportamentos. E, assim sendo, é o que revelamos aos outros (se bem que, cada pessoa, interprete os nossos comportamentos - e a nossa personalidade - à sua maneira; isto é, cada pessoa desenvolve uma "teoria" a nosso respeito logo a partir do momento em que nos conheça).

Segundo a psicologia, a personalidade é um agrupamento permanente e peculiar de características pessoais que podem mudar conforme as circunstâncias. Ou seja, embora tenhamos um determinado perfil de personalidade, ela não é rígida e imutável. Essa mesma capacidade de adaptação às situações da vida diz muito sobre quem somos. A nossa maior ou menor flexibilidade para a mudança já traduz, em parte, a nossa própria personalidade.

Conhecem-se cerca de 300 adjetivos que podem ajudar a descrever a  personalidade de alguém tais como "sensível", "ambiciosa", "introvertida", "forte" ou "exigente". Hoje em dia existem muitos testes que permitem distinguir os nossos principais traços.

PERSONALIDADE APRENDIDA

Nós já nascemos com uma personalidade! Mas isso não significa que ela esteja completamente formada. Nos primeiros anos, a personalidade vai-se reforçando com novos atributos que encaixam na nossa matriz biológica. A época, o local, a família e a sociedade intervêm na formação da personalidade.

Os alicerces da personalidade, dos quais faz parte o temperamento, tem uma forte composição genética mas durante a vida vai-se modificando - se bem que, a partir do final da adolescência, os principais traços estejam construídos e dificilmente poderão ser removidos. Por exemplo, quem for introvertido, terá sempre alguma dificuldade em socializar-se pois tende a ser tímido, a recolher-se no seu "cantinho" e a ter um comportamento "fechado".

Os nossos recursos básicos, nomeadamente a inteligência, a determinação, a afetividade, o sentido de justiça e muitos outros elementos, fazem a personalidade. Assim, a forma como gerimos a nossa vida, as nossas escolhas e os nossos comportamentos revelam a pessoa que somos, ou seja, a nossa personalidade.

Um número considerável de atributos são aprendidos, especialmente através do contacto com os outros. É aí que entra a educação. A Teoria Educativa da Personalidade, do professor espanhol J. A. Marina (2004), defende que "aquilo que define uma personalidade é o modo como um indivíduo escolhe e realiza os seus planos pessoais, aplicando os seus recursos numa determinada situação". 

O modo como agiremos na vida dependerá de um conjunto de aptidões cognitivas, afetivas e executivas aprendidas. Essas aptidões incluem hábitos e competências adquiridas que iremos aplicar nas diferentes situações da vida conforme os interesses em jogo e também as expectativas (as nossas e as dos outros). 

Se, enquanto crianças, estamos um pouco ao sabor de funções básicas da nossa matriz biológica, já em adultos estamos mais libertos do determinismo genético e temos mais poder de opção, ainda que seremos sempre influenciados pelos grandes traços de personalidade (geralmente estáveis e presentes em todas as situações).

A educação poderá (deverá) despertar características não despertas ou abafadas e fornecer-nos igualmente novas competências, nomeadamente intelectuais, emocionais e culturais que usaremos ao longo da vida. 

Defendo que é responsabilidade da educação ajudar as crianças a desenvolverem uma personalidade sadia e inteligente que lhes forneça a sabedoria necessária para serem capazes de agir adequadamente ao longo da vida, pondo em jogo os seus recursos cognitivos, afetivos, volitivos e sociais.

J. A. Marina diz que a educação deve colaborar na ampliação dos recursos de cada criança para que ela atue em todos os setores da vida, nomeadamente nas "ações dirigidas à sua felicidade". Eu concordo.

Nelson S. Lima

Bibliografia:
Marina, J.A.(2004) "Aprender a Vivir", Ed. Empresas Filosóficas, Madrid.
Schultz, D. e Schultz, S.E. (2001) "Theories of Personality", Wadsworth Publishing Company, Belmont (Califórnia).

RITMO BIOLÓGICO: OS TEMPOS DA VIDA


A perceção que temos do tempo é que ele é linear (parece existir no sentido do passado para o futuro) e simultaneamente cíclico (a noite e o dia, as estações do ano que se repetem, etc.). Uma representação gráfica destas duas perspetivas dá qualquer coisa como o que está representado na imagem acima e que explica o seguinte:

O círculo representa o tempo cíclico – o dia/noite, por exemplo, repete-se amanhã “como se” voltássemos para trás mas o dia/noite de amanhã já está no futuro “empurrado” pelo fluxo do tempo – a seta horizontal. Da mesma forma vamos “regressar” ao Inverno, à Primavera, etc. Trata-se de uma representação gráfica aceite pela cronobiologia atual.

Ou seja, na prática, significa que, embora tenhamos a noção de que seguimos para um tempo que designamos como futuro, há também uma repetição de horas, dias da semana, meses do ano e estações. Assim, sabemos que o dia tem 24 horas findas as quais segue-se mais um dia de 24 horas e por aí adiante. Da mesma forma sabemos que ao Inverno segue-se a Primavera, o Verão, o Outono e regressamos ao Inverno – ainda que também saibamos que já não o mesmo Inverno mas o Inverno do ano seguinte.

Com a cronobiologia, a ciência passou a estudar a organização temporal dos seres vivos. Eles estão sujeitos às variações cíclicas dos eventos que ocorrem na seta do tempo. Assim como à noite o nosso corpo responde com a necessidade de dormirmos, com o alvorecer do dia ele prepara-se para nos fazer acordar e entrar em atividade. Já nos animais de vida noturna, a situação é inversa.

Esta variação que não depende tanto do tempo mas mais das variações ambientais e biológicas que afetam o ser humano conforme as horas dos dias ou as estações do ano é hoje objeto de atenção crescente por diversas ciências, em especial as ligadas à saúde.

Com efeito, porque somos um composto complexo de trocas químicas que decorrem do nosso metabolismo, estamos sujeitos a variações reativas e à suscetibilidade face a esse mundo oculto dos acontecimentos biológicos. Sabemos, por exemplo, que a pressão arterial sobe de manhã e desce à noite – não porque ela tenha horas marcadas para aparecer mas porque o nosso organismo assim se fez ao longo de milhões de anos de adaptação ao mundo.

A importância que devemos dar a estas variações justifica-se plenamente sob pena de sacrificarmos o organismo contra a sua natureza, desencadeando distúrbios de diversa ordem. Por exemplo, os hipertensos estão mais sujeitos a problemas entre as 6 e as 10 horas da manhã do que ao fim do dia devido ao facto da pressão arterial subir naturalmente nas primeiras horas da atividade diurna.

Um outro aspecto a ter em conta é aquilo que ingerimos. Toda a gente conhece o caso das pessoas que têm dificuldade em adormecer se tomarem cafeína ao fim da tarde, contrariando a necessidade do sono. Outro exemplo é o efeito do álcool no início da madrugada que afeta os sentidos e o tempo de reação do cérebro.

Os medicamentos tem também idêntico efeito. Ou seja, as horas a que são tomados também surtem efeitos mais ou menos acentuados. A chamada “cronofarmacologia” designa as variações rítmicas dos efeitos dos medicamentos ao longo do dia (de um lado temos as horas da sua máxima eficácia e do outro aquelas em que a sua toxidade pode aumentar bastante). Por exemplo, o efeito da aspirina varia conforme a hora em que é tomada. A sua eliminação pelos rins é mais curta quando é ingerida às 19 horas e mais longa quando é tomada às 7 da manhã (a diferença é muito grande: cerca de 25%).

Nelson S Lima
(texto publicado originalmente no site da Stop Cancer Portugal.

O DÉFICE DE ATENÇÃO FAVORECE A CRIATIVIDADE?


Thomas Edison, Oscar Wilde, Picasso, Winston Churchill, Alexander Graham Bell, Sylvester Stallone, Tom Cruise, Robin Williams, John Lennon, Mozart, Dustin Hoffman, Steve McQueen, Richard Branson e muitas mais pessoas célebres foram diagnosticados com o que hoje chamamos "défice de atenção", com ou sem hiperatividade e/ou impulsividade.

O que é que gera o défice de atenção clinicamente significativo? Resposta simplificada: um abrandamento na atividade de certas áreas pré-frontais do cérebro (onde também se processa a nossa capacidade de planificar e o auto-controlo, por exemplo) é a principal causa do défice de atenção sendo por isso que se receitam psicoestimulantes para que essas áreas trabalhem em sincronia (também chamada "entrar em fase de encerramento neural"), o que permite a focalização da atenção eliminando os factores de distração, nomeadamente a chamada "divagação mental" (que as pessoas chamam "estar na lua", "estar com a cabeça no ar", "estar ausente", etc.).

Ora vamos lá à questão que aqui me traz. Se têm défice de atenção, não podendo facilmente concentrar-se, como é que poderão ser pessoas criativas e até empreendedoras e bem sucedidas?

Fácil de explicar! A chamada "deriva mental" ou "divagação mental" todos nós temos em boa parte do tempo (em 40 a 50% do nosso dia-a-dia). Mas nas pessoas com défice de atenção essa "divagação" é mais extensa e expressiva pois têm dificuldade em focalizar-se, ou seja, em atingir a chamada "atenção seletiva" (por razões neuroquímicas e elétricas).

O professor de psicologia Jonathon Schooler, num estudo apresentado em 2010, revela que a "divagação mental" é maior nas pessoas com défice de atenção MAS É PRECISAMENTE isso que as torna receptivas a mais "insights criativos". Porquê?

Porque é nesse estado aparentemente "distraído" que o cérebro abre-se para ideias e pensamentos criativos pois a mente, vagueando entre muitos temas de "auto conversa interior", entra num "estado de serendipismo" (uma condição mental que produz ideias inesperadas) e de "consciência aberta" (o que não acontece quando estamos focalizados, centrados em algo).

Estudando a vida de pessoas criativas e empreendedoras descobriu-se que muitas sofriam de dificuldade de concentração (o défice de atenção é precisamente uma dificuldade em focalizar-se em algo de forma sustentada).

Ora isto deve levar-nos a repensar o ensino das crianças com défice de atenção. Elas podem ser ajudadas a gerir a sua atenção através de técnicas como a "prática da atenção plena". Aliás, serve para todas as crianças a partir dos 3 anos de idade, o que lhes vai proporcionar mais tarde aquilo que chamamos de "domínio cognitivo" (auto-controlo mental), com espetaculares resultados nas aprendizagens e até na inteligência prática (também chamada "executiva").

Por exemplo, as autoridades de Singapura - uma cidade-estado da Ásia com mais de 5 milhões de habitantes - contratou cientistas americanos e ingleses para ensinarem os professores a desenvolver nos alunos o "domínio cognitivo" (foto) mas também a criatividade através da "divagação mental".

Nelson S Lima

AINDA NÃO VI CORAGEM PARA MUDAR O ENSINO

Desde há uns vinte anos que leio livros relativos à educação, sobretudo dedicados à sua reforma e, muito em especial, obras que apontem para a inovação e a modernização inteligente no ensino escolar.

Ora bem, passaram-se todos esses anos e continua-se a escrever sobre o tema. Percebe-se. É como a saúde. Quer um, quer outro são matérias da máxima importância social, pelo que, como tal, são temas recorrentes.

Só que, pelo menos no que à educação diz respeito, não tem havido grandes ideias e, por isso, não se verificam inovações, as tais que o setor carece cada vez mais e à medida que o mundo do conhecimento (e o mundo em geral) se vai transformando rapidamente.

Um grande pensador americano, Peter Drucker, afirmou um dia que "a educação é o setor da sociedade que mais lentamente evolui" sendo preciso esperar décadas para que uma qualquer boa ideia - chamemos-lhe criação - se reflita integralmente no sistema.

O que retenho de mais curioso dessa reflexão de Drucker é a lista de culpados (sim, fica melhor do que dizer simplesmente "responsáveis") da situação pelo atraso em que o ensino se encontra em muitos países (nomeadamente países chamados "ocidentais"). Ora vejam só:

-  os pais dos alunos (geralmente, no que se refere à educação dos filhos, eles não simpatizam com mudanças que ponham em causa o seu próprio entendimento do que deve ser a educação);

- os alunos (eles aceitam algumas mudanças desde que estas não lhes exijam mais esforço ou que sejam muito diferentes do que entendem ser a escola, a não ser que lhes retirassem disciplinas que muitos abominam tais como a matemática, a história, a filosofia, etc.);

- os professores (com a devida licença, deixem-me dizer que os professores também não se mostram muito colaborativos em mudanças de formato, de conteúdos e outras "revoluções" mais sérias ao estilo de Edgar Morin - ler "Os 7 Saberes da Educação", uma verdadeira bíblia para quem ensina); e, finalmente,

- o Estado (geralmente representado pelos Ministérios da Educação que, vivendo já atolados em burocracias e em constantes (des)arrumações na máquina administrativa e nos recursos humanos, em especial os professores, não têm "cabeça" nem competência para pensar em mudar aquilo que se ensina e como se ensina).

Ora bem, isto dava "pano para mangas" mas não é aqui o lugar ideal para o fazer.

LIBERDADE PARA INOVAR

Em muitos países que eu conheço o problema não é assim tão grave pois vivendo neles povos por natureza organizados já resolveram a maioria dos problemas burocráticos dos respetivos ministérios da educação e, por isso, têm mais tempo e calma (e até liberdade) para pensarem na inovação no ensino.

Entretanto, continuam a escrever-se os tais livros sobre educação, cada autor propondo ideias, pistas e até interessantes soluções para um melhor ensino só que, com raras exceções, estão a perder tempo (a não ser dando o seu contributo científico, filosófico ou moralista) pois ninguém lhes liga (raro é, se é que já aconteceu, um livro sobre educação tornar-se num "best-seller").

Houve em tempos uma conhecida editora que me convidou a escrever um livro sobre "educação". Pensei no assunto e disse dá para os meus botões "eu tenho algumas ideias, que até podem ser consideradas anormais mas acredito nelas". Mas não vou escrever o livro. Não. E jamais o farei.

Ia arranjar muitos inimigos e meter-me em sarilhos (bastou-me um dia ter dado uma entrevista sobre a "reforma da educação" a um conhecido jornal e meia dúzia de supostos professores, a coberto do anonimato - isto do anonimato dá muito jeito nestas coisas - desancaram na minha pessoa que até fiquei atordoado com a falta de caráter demonstrada. Curiosamente, essa mesma entrevista levou a que outros professores, mais alinhados com as minhas ideias, me tivessem convidado a proferir uma série de palestras sobre o tema, o que fiz com todo o agrado e sem que alguém me tivesse adomestado).

Continuaremos a ouvir a palavra "educação" no rol daquelas que são centrais para a modernização de uma sociedade, tal como acontece com a "saúde", a "justiça", etc., e que estão sempre na boca dos políticos e depois refletidas nos jornais e nos tais livros.

Acontece que atualmente já não iremos com reformas educativas (remendos) mas com uma revolução de alto a baixo. Mas quem é o ministro (ou o Governo) que tem coragem para mexer nos interesses (e comodismos) instalados, nomeadamente nos sindicatos (extremamente conservadores para o meu gosto), nos pais igualmente conservadores nos seus padrões mentais, nos alunos e nos professores (aqueles que teriam de aceitar uma reciclagem da sua própria formação)? Provavelmente, como acontece noutras coisas humanas, vai ser tudo feito à pressa e por força de circunstâncias para já imprevisíveis.

E aqui nada mais tenho a dizer nem a acrescentar (embora a lista de erros colossais que a educação tem vindo a acumular comece a ser muito preocupante para o futuro dos jovens estudantes que vão encontrar uma sociedade para a qual estão cada vez menos preparados).

Nelson S Lima