Ramón Campayo, considerado o homem com o cérebro mais "rápido" do mundo. |
Revista: PREVENIR
Entrevistado: Nelson S. Lima
1. O autor Nicolas Carr foi nomeado para um prémio
Pulitzer com o livro "Os superficiais, o que a Internet está a fazer ao
nosso cérebro". Do ponto de vista da neurologia, o que se sabe sobre a forma como as novas
tecnologias estão a afetar a nossa forma de pensar e processar a informação?
- O
cérebro é um órgão que se distingue pela sua alta capacidade de adaptação a
novos desafios. É assim que ele está continuamente a permitir-nos aprender
novas matérias e a guardar imensa informação que nos chega de todos os recetores
sensoriais usando o chamado "registo automático da memória".
Toda a
exposição a novos desafios, problemas e ambientes ajuda a estimular e a
desenvolver as diferentes áreas cerebrais que sejam solicitadas. Isso deve-se à
neuroplasticidade, isto é, a capacidade do cérebro em se desenvolver já que é
um órgão altamente dinâmico e flexível que recebe milhares de estímulos por segundo,
permitindo-nos caminhar, ouvir, reconhecer rostos, falar, criar, aprender,
sentir, planificar atividades, antecipar situações, etc. As novas tecnologias
são apenas mais um desafio de adaptação neurológica mas o seu impacto é maior a
nível psicológico e comportamental.
2. É verdade que a receção de uma informação provoca a libertação de dopamina, associada ao prazer e entusiasmo? Podemos dizer que tem um efeito “viciante” ou compulsivo”?
2. É verdade que a receção de uma informação provoca a libertação de dopamina, associada ao prazer e entusiasmo? Podemos dizer que tem um efeito “viciante” ou compulsivo”?
- O cérebro liberta inúmeros
neuroquímicos que são necessários a toda a atividade mental. A
"injeção" de qualquer estímulo (seja visual, auditivo ou qualquer
outro que nos dê algum tipo de prazer e recompensa) é suscetível de gerar um
efeito viciante em determinadas circunstâncias e em função de inúmeros fatores
que também podem ser sociais e culturais. É o caso do tabaco ou do álcool.
3. Existem limites para a quantidade, velocidade e intensidade da informação processada pelo nosso cérebro?
3. Existem limites para a quantidade, velocidade e intensidade da informação processada pelo nosso cérebro?
- Cada
pessoa, conforme a sua estrutura cerebral e psicológica, tem um limite
relativamente à quantidade, à velocidade e à intensidade de informação que é
capaz de processar. A maioria dessa informação (cerca de 90 a 95%) processa-se
em níveis não conscientes. Apenas conseguimos perceber e ter consciência de uma
quantidade ínfima de estímulos. Todos são processados e depois
"arrumados" sob a forma de memórias (emocionais, autobiográficas,
etc.)
4. Como pode a exposição a informação em excesso afetar...
- A nossa capacidade de memória a curto e/ou longo prazo?
- A nossa capacidade de memória a curto e/ou longo prazo?
- Excessiva informação leva a
perda de focalização e perda de muita informação.
- A nossa capacidade de distinguir informação importante de acessória?
- A nossa capacidade de distinguir informação importante de acessória?
- O
síndrome do pensamento acelerado e o stress são duas consequências da exposição
ao excesso de informação e, eventualmente, à perda da capacidade de análise e
do sentido crítico para separar o importante do acessório. Por outro lado, não
podemos esquecer que o excesso de informação obtida num prazo curto leva também
à fadiga visto que o cérebro é chamado a um esforço suplementar. Essa fadiga
provoca diminuição da concentração e fraca memorização das matérias que interessem fixar.
- A qualidade do nosso sono?
- A qualidade do nosso sono?
- A fadiga é a principal
consequência do excesso de informação sobre os nossos ritmos biológicos,
nomeadamente o da vigília-sono. Também a ansiedade devida a esse esforço gera
dificuldade ao nível do sono, sendo responsável por muitas insónias (que afetam
cerca de 25% das pessoas no mundo ociental).
- Os nossos níveis de stress e ansiedade?
- Os nossos níveis de stress e ansiedade?
- A saturação de informação
aumenta os níveis de stress e ansiedade, em particular se essa informação for
relevante para a nossa vida. É o que acontece com os estudantes que em vésperas
de exames tentam memorizar muita matéria. Geralmente, os seus níveis de
ansiedade ficam elevados e perdem muita informação que fica bloqueada na hora
em que mais dela precisam.
5. A alternância constante entre tarefas diferentes (multitasking) afeta a nossa capacidade de concentração e consolidação do conhecimento? Como?
5. A alternância constante entre tarefas diferentes (multitasking) afeta a nossa capacidade de concentração e consolidação do conhecimento? Como?
- É uma
das causas mais frequentes do stress ocupacional, do esgotamento e da perda de
concentração, o que dificulta a construção do conhecimento. A alternância de
tarefas obriga a um desdobramento da atenção, a qual rapidamente perde a sua
força inicial, reduzindo a nossa capacidade de resposta e reação.
Saber usar a tecnologia
6. No dia-a-dia, que sinais e/ou sintomas podem denunciar que estamos a atingir o limite da nossa capacidade de processar informação?
- São muitos os sintomas conhecidos e que geralmente se acumulam: dificuldade de concentração, dificuldade de memorização, dificuldade de recordação, fadiga, perda de reflexos, insónias, ansiedade, stress e problemas psicossomáticos (disfunções orgânicas de origem psicológica), etc.
Saber usar a tecnologia
6. No dia-a-dia, que sinais e/ou sintomas podem denunciar que estamos a atingir o limite da nossa capacidade de processar informação?
- São muitos os sintomas conhecidos e que geralmente se acumulam: dificuldade de concentração, dificuldade de memorização, dificuldade de recordação, fadiga, perda de reflexos, insónias, ansiedade, stress e problemas psicossomáticos (disfunções orgânicas de origem psicológica), etc.
7. Indique algumas medidas que recomendaria a alguém que tem de gerir e trabalhar com várias tecnologias diariamente (email, internet, telemóvel, ipad...) para conseguir aproveitar o que de melhor elas têm para oferecer e também...
1º Gerir bem o tempo, definindo prioridades, instituindo intervalos entre tarefas.
2º Ter tempos livres mais repousantes e regulares.
3º Dormir melhor (socorrendo-se de estratégias naturais e de uma
alimentação "light".
4º Diminuir o stress, nomeadamente gerindo o pensamento e evitando a ruminação em problemas.
4º Diminuir o stress, nomeadamente gerindo o pensamento e evitando a ruminação em problemas.
5º Caminhar (diminui a ansiedade e baixa a tensão) e evitar o
sedentarismo.
6º Melhorar a concentração e produtividade (organizando-se melhor)
7º Melhorar o uso consciente da memória (agendando as tarefas).
6º Melhorar a concentração e produtividade (organizando-se melhor)
7º Melhorar o uso consciente da memória (agendando as tarefas).
Mais-valias tecnológicas
8. Existem cada vez mais aplicações para ipad e iphone que se
propõem ajudar a melhorar a saúde (da alimentação, ao sono, exercício físico,
medicação, etc.). No seu dia-a-dia recorre a algumas? Pode sugerir algumas às
leitoras da Prevenir?
- Trabalho bastante com o computador - chega
a tomar-me 8 horas ou mais diariamente -
e tenho múltiplas tarefas e viagens de trabalho. A minha primeira
preocupação centra-se em manter uma boa saúde pelo que procuro controlar o
stress fazendo caminhadas, exercício físico variado, interrupções entre
tarefas, exercícios de stopping (fechar os olhos alguns minutos várias vezes
por dia), meditação, exercícios de relaxamento, uma alimentação frugal
tendencialmente vegetariana, pequenas refeições e bons relacionamentos sociais
e familiares.Dou uma grande importância à estabilidade emocional pelo que, com tudo isto junto, consigo atingir um elevado nível de produtividade. Considero também importante a adoção de uma postura otimista e positiva perante a vida em geral, mesmo perante problemas prementes.
Desde que modifiquei o meu estilo de vida e passei a adotar o que atrás descrevo deixei de me cansar ou queixar-me de falta de concentração e, todavia, trabalho muito mais do que há 20 anos.