Gosto muito da teoria do professor espanhol José António
Marina (autor, entre outros, do livro Inteligência Criadora) sobre a construção
da personalidade. Ele distingue três fases na emergência da personalidade no
ser humano: a personalidade recebida (a matriz pessoal, geneticamente
condicionada cujos principais elementos são as funções cognitivas básicas, o
temperamento e o sexo); a personalidade aprendida (conjunto de hábitos
afectivos, cognitivos e operativos a partir da personalidade-básica e que
formam o carácter) e a personalidade escolhida (que inclui o projecto vital e o
sistema de valores e que traduz o modo como a pessoa concreta, numa situação
concreta, enfrenta ou aceita o seu carácter).
Resumindo, temos:
Funções básicas + temperamento + sexo = personalidade recebida
Personalidade recebida + hábitos = personalidade aprendida
Carácter + comportamento = personalidade escolhida.
Temos pois, como ponto de partida, uma matriz biológica
(onde se destaca o temperamento) sobre a qual se constroem as fases seguintes.
Quer isto dizer que a personalidade é algo dinâmico que
permite ao sujeito um amplo espaço de liberdade de escolher e agir no mundo.
Não obstante, aquele que, por exemplo, vive sobre o efeito poderoso da matriz
biológica está muito dependente do temperamento e do acaso.
Esta sua teoria, refere Marina, está próxima da de Walter
Michel, o qual considera que os traços principais da personalidade são:
- Os valores subjectivos, preferências, metas.
- O modo como um sujeito constrói e processa a informação
referente a si mesmo, aos outros e aos acontecimentos do mundo.
- As expectativas sobre as consequências da acção.
- As competências cognitivas e comportamentais.
- Os sistemas auto-reguladores e a capacidade do sujeito
para manter os planos a longo prazo.
Não sendo tão prisioneiros dos genes e da hereditariedade
(como antes se pensava) podemos então concluir que aquilo que define a
personalidade é o modo como escolhemos e realizamos os nossos planos pessoais
com a ajuda das nossas faculdades, aptidões e aprendizagens.
Um estudo recente publicado numa revista da Association for
Psychological Science (USA) concluiu que, ao contrário do que se pensava
antigamente, vários traços de personalidade podem mudar ao longo da vida, mesmo
depois dos 60 anos de idade.
O carácter flexível de várias características, influenciado
por numerosos factores (meio, educação, auto-aprendizagem, etc.), tornam as
pessoas diferentes à medida que avançam na idade. É evidente que essas
alterações variam de indivíduo para indivíduo mas o estudo realizado atesta que
ninguém escapa a esse processo de mudança.
No caso, por exemplo, da "estabilidade emocional"
ela tende a acentuar-se com a idade sendo mais evidente em idades mais avançadas
no que nas idades mais jovens. A "estabilidade emocional" é um dos
factores da personalidade conhecido como "neuroticismo". Outros
traços, como a "abertura à experiência" e a
"sociabilidade", tendem também a sofrer alterações.
Um dado muito curioso é que, na generalidade, as mudanças
ocorridas na nossa personalidade ao longo da vida são de sinal positivo. Por
outras palavras, tornam a personalidade mais agradável.