Pintura de Fernand Khnopff, I Lock the Door Upon Myself, 1891 |
EU sou EU? Encontrei esta pergunta num texto de Nicholas Humphrey, psicólogo, doutorado em Fisiologia (autor de vários livros sendo um deles "A História da Mente",1992) e a quem o conhecido filósofo Daniel C. Dennett chamou de ser um "cientista romântico".
Nicholas levantou uma outra questão que ele entendeu pertinente: "Como podem um corpo e um cérebro humanos serem
também uma mente humana?"
Para tentar dar uma resposta convincente, Nicholas estudou
vários anos. Estas coisas que nos parecem do senso comum são, porém, bastantes
complexas e não podem ser resolvidas com uma resposta intuitiva que nada diz
sob o ponto de vista da verdadeira Ciência.
A pergunta poderia ser respondida por filósofos,
especialmente os que se dedicam ao estudo da mente. Mas, Nicholas é psicólogo e
investigador. Desenvolveu uma teoria que chamou de "consciência
reflexiva". Quando escreveu os livros Consciousness
Regained (1983) e The Inner Eye (1986)
o famoso biólogo evolucionista Richard Dawkins declarou, entusiasmado: "Acho que ele acertou em cheio! Temos por
fim a resposta para uma grande questão: como evoluiu a consciência
humana!".
Afinal, o próprio Nicholas verificou que estava ainda tudo
por resolver. Disse ele que a
consciência pode existir a níveis muito baixos, sem existir reflexão, como uma
experiência do ser em bruto, a sensação do tempo presente e sensações
primitivas como as proporcionadas pelos sentidos. Ou seja, pode-se ser
consciente com um mínimo de informações sensoriais. Ele chama a isso o "momento espesso" da consciência.
É o que acontece quando uma pessoa se sente viva e viva no momento presente
sentindo o mundo à sua volta.
A questão que ele levanta é o da qualidade das sensações
recebidas. São essas que permitem a sensação consciente. O seu trabalho em
laboratório deu-lhe pistas. Estudou a preferência estética dos animais.
Descobriu, por exemplo, que os macacos gostam do azul/verde forte, não apreciam
o amarelo, o laranja e o vermelho e o azul acalma-os. Percebeu que os macacos
são muito mais sensíveis às cores do que os seres humanos e que, por outro
lado, são insensíveis aos sons musicais preferindo o silêncio.
Mais tarde propôs que os constituintes básicos da
consciência são os sentimentos e as sensações em bruto (aproximando-se do que
António Damásio defende). Para Nicholas a consciência é "a reação imediata
do corpo aos estímulos". Já para o seu colega Daniel Dennett esses constituintes
são as ideias, os juízos e as predisposições pelo que a consciência só ocorre
depois da mente ter construído uma história e "ter feito um
relatório".
Diz Nicholas: "Eis
o meu modelo de realidade: eu sou eu. Estou a viver uma existência corporizada,
no momento espesso do presente consciente" e cita um poema de
E.E.Cummings:
"Como o sentir está primeiro
quem presta atenção
à sintaxe das coisas
nunca beijará inteiramente"
O biólogo Francisco Varela (já falecido) não achou a
explicação de Nicholas muito convincente. Mas concordou que a ideia de usar a
experiência direta - as sensações - para descrever os processos cerebrais da
consciência foi muito esclarecedora. Para Varela o "sentido do Eu existe porque nos dá uma interface com o mundo".
Embora a consciência do EU não exista como substância, ele acontece como
resultado das permanentes interações com o mundo.
Quando perdemos a consciência o que acontece? Deixamos de
interagir com o mundo. Quando esta interação reaparece, a consciência
apodera-se de nós. Voltamos a estar conscientes. Tal como aconteceria com outros animais. Só que nós vamos mais longe. Como temos uma autoconsciência sabemos quem somos ("ou, pelo menos,
acreditamos nisso" - diriam alguns).
Mas ainda subsistem muitas dúvidas nesta matéria. Sabemos o
que é a consciência e o que é a autoconsciência. Não temos, porém, ainda
respostas para perguntas como as que o professor de biologia cognitiva e
comportamental Christof Koch, do California Institute of Technology, lançou na
revista Scientific American.
Diz ele que, apesar dos cientistas estarem a revelar a base
material da mente consciente (usando recursos como a ciência da informação e a
matemática!) falta ter certezas sobre questões como:
- um paciente gravemente doente pode estar consciente? Que nível de consciência?
- quando é que uma criança adquire consciência si?
- um cachorro não tem mesmo autoconsciência?
- e quanto à internet, com seus milhões de milhões (bilhões)
de computadores conectados, poderá um dia adquirir uma consciência?