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O FUTURO DA HUMANIDADE?



"Todos precisamos de pensar no futuro de modo diferente: um futuro crivado pela mudança, pelo desafio, pelo risco. É uma nova espécie de futuro: não a marcha firme e penosa de progresso entre um momento e o seguinte, pontuada de breves explosões de inovação que caracteriza grande parte da História. (...) O futuro das nossas vidas, do nosso trabalho, dos nossos negócios - e, acima de tudo, o futuro do mundo - depende de adquirirmos um novo conhecimento sobre as mudanças vertiginosas que se estendem à nossa frente. Chamo-lhe "estar pronto para o futuro". (...) Aproximam-se mudanças extremas que designo como Futuro Radical: um futuro altamente dinâmico, disruptivo e multidimensional". Foi assim que o investigador e futurologista James Canton, presidente do Institute for Global Futures, descreveu os tempos que se aproximam, os quais, pela natureza e amplitude das transformações, serão surpreendentes e paradoxais para muitos milhões de seres humanos.

Um dos primeiros documentos que chamavam a atenção para esta fractura com o passado tem um título apelativo e esclarecedor. É o Choque do Futuro, de Alvin Toffler. Seguiram-se outros trabalhos, alguns mais complexos, de diferentes autores onde se destacam Clare W. Graves, Richard Dawkins, Mihaly Csikszentmihalyi, Ken Wilber, Charles Handy, Jenny Wade, Susanne Cook-Greuter, etc.

Todos os seus contributos podem ser inscritos na psicologia do desenvolvimento - o estudo do crescimento e desenvolvimento da mente: o estudo do desenvolvimento e da evolução da consciência.

A maioria dos modelos elaborados até hoje baseiam-se na máxima "tempos diferentes exigem pensamentos diferentes" e defendem que a evolução da mente humana faz-se através de ondas ou estádios que se desenvolvem.

A inteligência criadora do Homem

"O antigo mapa mundial está obsoleto - estamos a sofrer a mais profunda reorganização do Poder Global desde o nascimento da civilização industrial (Alvin Toffler, New York Times, 31/10/93).

Estamos a subir rumo à Era Conceptual. Para trás ficaram - mas não desapareceram - as Eras da Informação, da Indústria e da Agricultura. Vivemos numa sociedade complexa onde coexistem 4 "mundos" ou sistemas de sociedade (do 1º ao 4º mundo). Pessoas e empresas da Era Fabril coexistem com pessoas e empresas da Era da Informação. E, umas quantas (2% da totalidade), estão a entrar e a formatar a Era Conceptual.

Quais são as implicações desta mudança de paradigma? Muitas. Precisamos de um novo tipo de consciência (ecológica e holística) para lidarmos com sucesso com as novas "tribos", impérios, ideologias e zonas de empreendimentos que cobrem o planeta. Temos de aprender a trabalhar de forma construtiva com sociedades humanas do 1º ao 4º Mundo, dos mais ricos aos mais pobres, dos capazes aos incapazes. E devemos tentar perceber porque é que a natureza humana causa tanto caos e perturbação. As querelas de hoje, tudo, alíás, o que o ser humano faz, tem implicações intercontinentais.

O mundo está sempre a mudar. Em cada Era ou fase, as "visões do mundo" e a mente humana alteraram-se. "Entre cada etapa da história humana peregrinamos de um despertar para outro, tornando-nos seres ligeiramente diferentes em cada pessoa. Novos tempos produzem novos pensamentos à medida que são criadas novas teorias de tudo, que a história é revista, que as prioridades e os valores são reordenados-empilhados, e as pessoas admiram-se de não terem visto antes tudo tão claro" - escrevem Beck & Cowen (1993), com a concordância de Ken Wilber (2005).

Rumo a um futuro não improvável

A primeira vez que me interessei apaixonadamente pelo estudo da inteligência humana deu origem a meu primeiro livro. Intitula “5 Mil Anos de Transportes” (1980) e está esgotado. Tem 500 páginas e 200 fotos.

Para a época foi um empreendimento pessoal que me exigiu grande esforço pois não havia nem computadores nem internet e todo o trabalho de pesquisa exigiu intensa troca de correspondência com centenas de instituições de todo o mundo, incluindo a NASA (que me forneceu elementos para o 17º e último capítulo que procura desvendar o futuro dos meios de transportes). Mais tarde, esse livro serviu de base a minha tese de doutoramento em Investigação que incidiu sobre a relação entre Inteligência e Criatividade.

Depois de investigar como, ao longo dos últimos 5 mil anos, o ser humano foi capaz de conceber e desenvolver diferentes formas de se deslocar no planeta, permitindo-lhe incrementar as trocas comerciais, promover a expansão marítima, a conquista do ar e a aventura no Espaço fiquei ciente de que para a “inovação empreendedora” a necessidade constitui um dos principais, senão mesmo o principal, factor de criatividade.

De facto, com raras excepções, é devido à necessidade de resolver problemas que a nossa mente age em busca de soluções. Não havendo esse sentimento, ficamos embalados no conformismo e na acomodação das situações. E então nada acontece de novo.

Fundamentos históricos da inteligência criadora

A nossa espécie é muito recente na história do planeta. Ela terá entre 150 mil e 200 mil anos. Surgiu a partir de ancestrais cujo aparecimento é muito anterior, no mínimo 2 a 4 milhões de anos. Mas até recentemente – cerca de 10 mil anos – o nosso cérebro não mostrou grandes feitos.

Os primeiros indícios de inteligência criadora datam de apenas há 300 ou 400 mil anos, com as primeiras lâminas em pedra criadas para rasgarem e prepararem peles. Depois foram surgindo outros tipos de instrumentos. Por exemplo, há cerca de 120 mil anos já havia ferramentas em osso. E, mais recentemente, há uns 40 mil anos, a inovação de pontas de projétil usadas como armas, serviram para caçar animais de uma distância segura e também para uso nas lutas entre tribos rivais.

Veja-se agora o reflexo destas primeiras inovações no progresso social. O aumento do número de artefactos para trabalhar, caçar e lutar incentivou a cooperação entre famílias e tribos, promovendo-se dessa forma o desenvolvimento de redes sociais e o estabelecimento de acordos. As trocas de produtos começaram a processar-se a um ritmo crescente. A melhoria de contactos facilitou maior protecção entre grupos e com isso o aumento da população. A competição agudizou-se igualmente e o progresso começou a tornar-se numa marca da genialidade humana.

Entre 50 mil e 20 mil anos atrás ocorreu, por fim, uma mutação genética em algum grupo socialmente mais activo que teve o efeito de tornar o cérebro de seus membros capaz do chamado pensamento simbólico e da linguagem. Estas novas aptidões cognitivas tornou-os mais inteligentes tendo com isso adquirido uma vantagem considerável sobre os povos não-portadores de tal mutação que, por via disso, foram sendo ultrapassados e substituídos.

Com a capacidade pensar simbolicamente e de usar a palavra como instrumento de comunicação de ideias e conhecimentos, os nossos ancestrais mais directos rapidamente se tornaram autónomos. Criaram a agricultura, a pastorícia, o comércio e demais actividades. E com elas, novas ferramentas, novos processos de trabalho e de negócio. Mais recentemente, o dinheiro – outra invenção genial – facilitaria as actividades mercantis. Barcos e carros de tração animal começaram a transportar mercadorias para paragens cada vez mais longínquas. A primeira grande onda de progresso estava em movimento!

O papel do comércio no desenvolvimento da inteligência humana não pode ser ignorado. Foi graças a ele que a navegação se desenvolveu com a criação de mais e melhores embarcações que puderam então viajar até mais longe e com maior segurança. Foi através do comércio que muitos povos isolados iniciaram intercâmbios com outras populações, adquirindo novos produtos, modas e conhecimentos. O comércio incentivou a aplicação da aritmética e da linguagem, a invenção da escrita e do papel, a criação de estradas, etc. As necessidades crescentes de consumo e a satisfação da curiosidade levaram o cérebro humano a desenvolver mais ramificações internas entre os neurónios, como acontece com os bebés à medida que crescem e aprendem coisas novas. As pessoas tornaram-se mais espertas, mais ágeis no pensamento prático e na resolução de problemas.

A competição continuou a crescer. Umas vezes conduziu a guerras devastadoras e à escravatura de povos. Outras vezes turbinou a inteligência criadora melhorando processos de trabalho, desenvolvendo ferramentas, acelerando a criação de novos produtos em diferentes tipos de materiais (barro, ferro, estanho, etc.). Essa competição esteve sempre na base do progresso técnico, social, cultural, artístico e económico. Já não era a necessidade de sobrevivência que ditava as leis mas a necessidade de riqueza, comodidade, bem-estar e poder.

No século XXI a inovação em gestão é vital

Desde a invenção da roda que 5 a 10 mil anos se passaram. Os primeiros carros de tracção animal usados no transporte de colheitas e mercadorias datam de há 3 a 4 mil anos. Os primeiros achados de veículos em madeira foram detectados na antiga Suméria, no Próximo Oriente, onde se desenvolveram grandes cidades comerciais.

Em 5 mil anos o mundo transformou-se profunda e radicalmente. Podemos encontrar diferentes ondas. Alvin Tofler descobriu três. A primeira durou até à revolução industrial e era dominada pela agricultura. Depois seguiu-se a Era industrial e, finalmente, a sociedade da tecnológica que hoje vivemos, com toda a complexidade de sistemas, processos e redes. O mundo se tornou numa “aldeia global”, ficou “plano”. O incremento das relações humanas e a facilidade com que se processam atingiram valores impensáveis há apenas 20 anos.

De um momento para outro, as organizações humanas viram-se confrontadas com a necessidade de novas formas de gerir os negócios e interesses em todos os domínios: na produção, na comercialização, no financiamento, nas relações com os consumidores, etc.

As regras e as práticas da era industrial começaram a ficar obsoletas e a darem mostras de incompatibilidade com a natureza complexa, ambígua e indeterminada dos tempos actuais. O simples método da previsão, tão em voga na sociedade fabril, deixou de funcionar. Toda a previsão em negócios é agora um exercício de alto risco dada a cada vez maior instabilidade dos mercados, as modificações observadas ao nível da psicologia dos consumidores e ao cada vez mais curto ciclo de vida dos produtos.

A actual era exige dos gerentes e administradores novas competências e sobretudo novos talentos. Já não basta ter vocação ou paixão pelos negócios. Isso não é garantia de sucesso. Agora é preciso mais, muito mais.

As empresas sentem-se cada vez mais na necessidade de contratarem os melhores colaboradores, não apenas os das posições superiores mas também os que desempenham actividades mais rotineiras e até aqui pouco estimadas como a das recepcionistas. Na verdade, a Era que vivemos já não é a da informação e do conhecimento. Estamos sim na era da inteligência e do pensamento competitivo (Era Conceptual).

A inovação em gestão e em governação é vital. A actual crise financeira internacional é o reflexo de mudanças subterrâneas que estavam acontecendo e que anunciavam a nova Era. Quase todas as empresas, mesmo as mais bem dotadas de genialidade, foram apanhadas de surpresa e assistem, incrédulas, ao desmoronar de crenças, normas, práticas, ideias e processos que serviram adequadamente na sociedade fabril mas que se tornaram quase inúteis nos novos tempos.

É tempo de pensar rapidamente no que fazer. É urgente inovar na gestão. Não basta o apoio dos governos para a crise económica que afecta todo o mundo. Isso será apenas uma panaceia para cobrir problemas financeiros imediatos. É tempo de agir e preparar o futuro que já está à nossa frente.

A inovação passará também pelo ensino e a formação, sectores que em geral se encontram desajustados das necessidades da Era Conceptual. Um novo tipo de pensamento prático torna-se urgente desenvolver nas escolas, nas universidades e nas empresas.

Finalmente, as leis de Darwin – que explicam a evolução dos sistemas vivos – estão mais actuais do que nunca no mundo empresarial: só os mais fortes, competitivos e inteligentes sobreviverão. Mas, ao contrário do que se passa no reino animal, onde a evolução acontece geralmente de forma gradual, sem grandes rupturas e descontinuidades, no mundo das instituições e das empresas, a evolução pode ser marcada por grandes saltos, bruscas viragens de direcção e eventos muito rápidos e imprevisíveis.

Assim sendo, razão terão alguns visionários que profetizam o desaparecimento de mais de 80% das empresas actuais nos próximos 5 a 10 anos em todo o mundo! É que poucas terão massa cinzenta apurada para discernir sobre o que fazer realmente. Continuarão agindo como na Era Fabril, incrédulas perante o infortúnio e a surpresa da mudança. Fecharão as portas. Felizmente para a sociedade e a economia, ficarão aquelas que estão despertas para a natureza das transformações que terão de enfrentar e também as empresas de nova geração que estão desabrochando no horizonte.

Finalmente, deixem-me que lhes diga o seguinte: as empresas actuais não podem agir como fizeram os proprietários das diligências do século XIX quando se aperceberam que o caminho de ferro podia ditar o seu fim. Durante anos protestaram contra o novo meio de transporte, clamaram por apoios dos governos e dos parlamentos. Lançaram boatos. Atentaram contra as ferrovias. Fizeram explodir locomotivas. Nada feito. Há muito tempo que não há diligências nas estradas.

Os tempos que vivemos são complexos e tempestuosos. Mas o mundo ficará melhor servido, com renovadas e melhores organizações, quando, quais "feiticeiros da espiral," os líderes empresariais adquirirem uma visão integral do mundo e não uma visão compartimentada como tem acontecido.

Bibliografia:
Beck, Don E. & Cowan, Christopher C., Spyral Dynamics, 1996
Wilber, K, A Theory of Everything, 2001. 
Lima, N., 5000 Anos de Transportes, 1981.