Este é um tema complexo embora lidemos todos os dias com ele: o da "verdade". De forma simples e imediata nós entendemos como verdade aquilo que se pode provar. A verdade é algo factual, que pertence ao mundo do objetivo, do concreto, do específico. Aliás, antigos filósofos, como os estóicos, diziam que a verdade é do domínio da ciência, do conhecimento. Pode ser contestada mas não perde a sua essência: a verdade é sempre verdade. Se assim não fosse pertenceria ao domínio do "falso", da "mentira" ou do "engano".
Lidar com a verdade é um exercício complexo. É que, para
muitas pessoas, a verdade está colada a alguma forma de crença. Se uma pessoa
acredita que algo corresponde à verdade é difícil, por vezes, fazê-la crer que
pode estar enganada. Só que o problema é mesmo complexo porque quem nega uma
verdade que outro defende pode estar enganado. E então quem tem razão? O que
deve prevalecer perante duas verdades em que, hipoteticamente, uma delas não é
verdade?
ESTAMOS SEMPRE SUJEITOS AO EFEITO PLACEBO
Um exemplo muito corrente é o das testemunhas de acidentes. Cada uma delas tem a sua verdade e está disposta a jurar por ela. Quando alguém diz falar a verdade quando todos os outros dizem ter verdades que são distintas da sua gera-se a confusão. É por isso que os tribunais se enganam muitas vezes nos seus juízos. E os jornais também. E todos nós.
Durante séculos prevaleceram "verdades"
reconhecidas por autoridades que se assumiam "donos do saber", como
foi o caso da igreja católica. A inquisição - polícia religiosa - não tinha
problemas em perseguir e aniquilar quem tentasse ou teimasse afirmar que o que
era propagado como verdade não passava, afinal, de um erro e era, por
conseguinte, "falso". Na ciência também ocorre muitas vezes.
Nas relações humanas, a verdade anda sempre de mãos dadas
com a crença (do género "eu acredito que é verdade"), os erros de
percepção (o nosso cérebro engana-nos frequentemente e os mágicos sabem muito
bem como trocar as voltas à nossa visão fazendo-nos acreditar em algo que não
passa de um truque). Aliás, o nosso cérebro, na ânsia de encontrar referências,
chega a construir modelos mentais que não passam de ilusões de ótica. E em
casos patológicos, temos as alucinações.
A verdade também pode ser compreendida na ótica do
observador. Eu posso estar perante uma verdade com força científica que
ulteriores observações vão pôr em causa. É assim que muitas vezes o
conhecimento avança.
O perigo da verdade é agarrarmos-nos de forma definitiva ao
que os nossos sentidos e o nosso entendimento nos fazem crer. Há muitos estudos
científicos que demonstram como é fácil as pessoas terem como verdade apenas
aquilo em que acreditam e nada mais.
O efeito placedo (usado em testes médicos e também em
marketing) é uma das provas mais fiáveis de fazer acreditar em algo que não
passa de um embuste. O hipotético medicamento a quem o investigador atribui
efeitos curativos leva o sujeito testado a sentir melhoras que são geradas pela
mente e não pelo falso remédio. A verdade é que muitas vezes o efeito placebo
funciona. É assim também que a publicidade funciona. Onde está a verdade? Ou há
mais do que uma verdade num mesmo facto?
VIVER COM CERTEZAS
No dia a dia é importante vivermos com certezas. Seria impossível vivermos num mundo em que tudo nos causasse dúvida por falta de garantias quanto à verdade com que precisamos de lidar. Mas, de facto, o tempo acaba por nos abrir os olhos e verificar que nem sempre o que nos pareceu verdade numa determinada altura não passou de uma não-verdade (talvez uma outra verdade mas não a esperada).
Não gosto muito das pessoas que estão cheias de certezas. Eu também tenho certezas e uma delas é que posso estar enganado! E isso faz toda a diferença pois estou sempre disponível para rever as minhas anteriores "verdades" e certezas.
Nelson S Lima