A perceção que temos do tempo é que ele é linear (parece existir no
sentido do passado para o futuro) e simultaneamente cíclico (a noite e o dia,
as estações do ano que se repetem, etc.). Uma representação gráfica destas duas
perspetivas dá qualquer coisa como o que está representado na imagem acima e
que explica o seguinte:
O círculo representa o tempo cíclico – o dia/noite, por exemplo,
repete-se amanhã “como se” voltássemos para trás mas o dia/noite de amanhã já
está no futuro “empurrado” pelo fluxo do tempo – a seta horizontal. Da mesma
forma vamos “regressar” ao Inverno, à Primavera, etc. Trata-se de uma
representação gráfica aceite pela cronobiologia atual.
Ou seja, na prática, significa que, embora tenhamos a noção de que
seguimos para um tempo que designamos como futuro, há também uma repetição de
horas, dias da semana, meses do ano e estações. Assim, sabemos que o dia tem 24
horas findas as quais segue-se mais um dia de 24 horas e por aí adiante. Da
mesma forma sabemos que ao Inverno segue-se a Primavera, o Verão, o Outono e
regressamos ao Inverno – ainda que também saibamos que já não o mesmo Inverno
mas o Inverno do ano seguinte.
Com a cronobiologia, a ciência passou a estudar a organização temporal
dos seres vivos. Eles estão sujeitos às variações cíclicas dos eventos que
ocorrem na seta do tempo. Assim como à noite o nosso corpo responde com a
necessidade de dormirmos, com o alvorecer do dia ele prepara-se para nos fazer
acordar e entrar em atividade. Já nos animais de vida noturna, a situação é
inversa.
Esta variação que não depende tanto do tempo mas mais das variações
ambientais e biológicas que afetam o ser humano conforme as horas dos dias ou
as estações do ano é hoje objeto de atenção crescente por diversas ciências, em
especial as ligadas à saúde.
Com efeito, porque somos um composto complexo de trocas químicas que
decorrem do nosso metabolismo, estamos sujeitos a variações reativas e à
suscetibilidade face a esse mundo oculto dos acontecimentos biológicos.
Sabemos, por exemplo, que a pressão arterial sobe de manhã e desce à noite –
não porque ela tenha horas marcadas para aparecer mas porque o nosso organismo
assim se fez ao longo de milhões de anos de adaptação ao mundo.
A importância que devemos dar a estas variações justifica-se plenamente
sob pena de sacrificarmos o organismo contra a sua natureza, desencadeando
distúrbios de diversa ordem. Por exemplo, os hipertensos estão mais sujeitos a
problemas entre as 6 e as 10 horas da manhã do que ao fim do dia devido ao
facto da pressão arterial subir naturalmente nas primeiras horas da atividade diurna.
Um outro aspecto a ter em conta é aquilo que ingerimos. Toda a gente
conhece o caso das pessoas que têm dificuldade em adormecer se tomarem cafeína
ao fim da tarde, contrariando a necessidade do sono. Outro exemplo é o efeito
do álcool no início da madrugada que afeta os sentidos e o tempo de reação do
cérebro.
Os medicamentos tem também idêntico efeito. Ou seja, as horas a que são
tomados também surtem efeitos mais ou menos acentuados. A chamada
“cronofarmacologia” designa as variações rítmicas dos efeitos dos medicamentos
ao longo do dia (de um lado temos as horas da sua máxima eficácia e do outro
aquelas em que a sua toxidade pode aumentar bastante). Por exemplo, o efeito da
aspirina varia conforme a hora em que é tomada. A sua eliminação pelos rins é
mais curta quando é ingerida às 19 horas e mais longa quando é tomada às 7 da
manhã (a diferença é muito grande: cerca de 25%).
Nelson S Lima