Penso que todos achamos óbvio que a pobreza causa numerosos
problemas às suas vítimas, nomeadamente no estado de saúde. Isso não acontece
apenas por falta de apoios, de dinheiro, de educação e de melhores condições de
vida.
O estado de pobreza gera hipersensibilidade no sistema
nervoso, causando problemas cognitivos, comportamentais, envelhecimento precoce
e menor esperança de vida.
Um estudo publicado na revista "Nature
Neuroscience" (nº 18, 2015), intitulado "Family Income, Parental
Education and Brain Development in Children and Adolescents" e assinado
pelo neurocientista K.G. Noble, concluiu que o cérebro das crianças que vivem
em condições de miséria é, aos 11 anos de idade, 5% menor do que o de crianças
de estratos sociais mais protegidos.
Note-se: a investigação abrangeu mais de mil crianças em
diversas fases das suas vidas.
O QUE ACONTECE?
Foi descoberto e confirmado em outros grupos idênticos que
as regiões do cérebro mais atrofiadas por condições de vida frágeis incluem o
córtex parietal (e restantes regiões envolvidas na linguagem, planeamento,
pensamento, aprendizagem e regulação da ansiedade) devido a hipersensibilidade
emocional, alimentação deficiente, ambiente familiar disfuncional, sentimentos
de incapacidade, medos e baixa auto-estima.
Tudo isto desencadeia desequilíbrios químicos no cérebro
devido a permanência de mais cortisol no sangue, o qual, por sua vez, aumenta a
quantidade de mielina que reveste os neurónios ligados ao hipotálamo (de onde
provém a noção do "eu") e à amigdala (que reage às ameaças).
Também a pobreza leva à falta de saúde por danificar o ADN e
as células. Resultado: pressão arterial mais elevada, mais doenças, menos
esperança de vida, menos chances de sucesso e défices cognitivos (daí o facto
das crianças pobres sentirem mais dificuldades em aprender).
Outro problema a considerar: uma criança que tenha crescido
pobre durante os primeiros 25 anos de vida vê diminuida a sua esperança de
vida, em média, seis anos.
Também se verificou que uma criança em situação de pobreza
enfrenta um risco 20 a 40% maior de morrer de doença, especialmente cancer, AVC
e ataque cardíaco numa idade mais precoce do que a de pessoas emocionalmente e
socialmente equilibradas graças a melhores condições de vida.
Este é o campo das neurociências que mais tem contribuído
para o estudo da biologia do cérebro e suas reações face aos desafios da vida,
sejam eles quais forem.
A neurociência, que atualmente junta cientistas
cognitivos, biólogos, neurologistas, neuropsicólogos, físicos e outros especialistas, está ainda na sua
infância mas o seu contributo para compreender a relação do sistema nervoso com
a saúde em geral e o ambiente tem sido notável.
Nelson S Lima